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Mudança de cultura para inclusão de mulheres pode trazer retorno para empresas

Diretora geral da divisão de soluções para provedores de serviço da NEC, Mayuko Tatewaki.

A redução da desigualdade de gênero no mercado de telecomunicações é um desafio para empresas, mas é sobretudo uma questão de mudança cultural. Além de lidar com a falta de oportunidades iguais, a necessidade de capacitação profissional para a área técnica, há também a qualificação para os cargos de liderança, e não só auxiliares. Para isso, a readequação estrutural nas empresas, com maior quantidade de oportunidades para as mulheres, é citada por diversas executivas ouvidas por este noticiário. Como impacto, a diversidade pode trazer resultados para a empresa além do posicionamento de marca, mas na geração de negócios.

Durante visita ao Brasil, a diretora geral da divisão de soluções para provedores de serviço da NEC, Mayuko Tatewaki, destacou a este noticiário como as iniciativas de inclusão são benéficas para a indústria. Ela conta que a participação feminina em telecomunicações é pequena, “e especialmente no Japão, é um pouco menor, mas está melhorando”. A razão, ela diz, é pragmática: a população japonesa está envelhecendo, e a média de filhos por família é de 1,4. “Então tem menos pessoas jovens em idade de trabalhar, por isso o governo precisa que as mulheres trabalhem.”

Tatewaki diz não sentir pressão maior no cargo por ser mulher, mas cita casos em que é a única no ambiente de trabalho, como uma sala de reuniões de executivos. “Eles não se lembrem de mim por meu nome, ou por uma característica ou pelo que eu faço. Eles falam ‘ah, esta é a mulher’. É meio estranho”, conta. A executiva da NEC diz que há muita presença feminina na indústria de telecomunicações globais em cargos de diretoria executiva, especialmente CTO, CIO ou CFO – ou seja, em tecnologia, informação e financeiro, respectivamente.

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As iniciativas de melhoria do ambiente de trabalho, como a possibilidade de home-office, ajudam as mulheres que ainda têm de cuidar de filhos e de casa. Mas ela reconhece que o autoquestionamento apareceu como uma barreira na carreira. “Acreditar em mim e nas minhas capacidades têm sido a história da minha vida, são os meus principais tópicos”, diz. “Eu diria que eu tive muita sorte, porque muita gente me ajudou. Mulheres tendem a pensar que não são boas o suficiente para essa função, que não são ‘elegíveis’ por não ter determinada habilidade, e aí nem sequer tentam.” 

O trabalho de autovalorização para que as mulheres se arrisquem mais ao se candidatarem a vagas não é fácil, ainda mais no contexto de barreiras impostas pela própria sociedade. Não por elas não serem qualificadas para as funções. A superintendente de Relações com os Consumidores da Anatel, Elisa Leonel, explica que há um déficit de formação técnica voltada às ciências exatas (ciência da computação, engenharia, matemática), mas também o impacto dos preconceitos e estereótipos na construção da segurança. “Elas pensam ‘não estou preparada, tenho medo’, e tem um processo de base, de formação de meninas”, diz. Para ela, esse é um problema intersetorial e de prática corporativa. “Elas engravidam, e isso é visto como um problema.”

Elisa Leonel, superintendete de relações com o consumidor da Anatel

No entendimento de Leonel, as empresas de telecomunicações têm mostrado práticas positivas para endereçar o assunto e isso é importante, porém há mais a ser feito. “Eu não acredito que as organizações vão superar a barreira de gênero se políticas não forem desenvolvidas e não forem abraçadas como estratégias do topo das corporações”, afirma. Para tanto, é preciso que as empresas encarem a redução da desigualdade como desafio estratégico. “Já seria legítimo justificar que se deve incluir mulheres porque nascemos iguais, mas se trata de gerar negócio, produtividade e riqueza para o mundo. Diversidade traz riquezas, esse é o ponto para as corporações que faz todo o sentido”, afirma. 

Cenário de liderança

O fato é que, dentre as operadoras brasileiras, grandes ou pequenas, há poucas mulheres na posição principal de liderança. Também nunca uma mulher foi nomeada ministra das Comunicações (ou do atual MCTIC), ou presidenta da Anatel – a agência só teve uma conselheira, Emília Ribeiro, entre 2008 e 2012.

A diretora jurídica e conselheira da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), Cristiane Sanches, diz que se vê “como um peixe fora d’água” por assumir um cargo de liderança no mercado. “Geralmente se vê mulheres na parte jurídica e regulatória. São cargos de apoio, não no front”, destaca. Mesmo no governo e na Anatel, ela entende que a participação feminina ainda é periférica, argumentando que geralmente isso ocorre nos corpos mais técnicos, uma vez que há influência política na indicação de cargos. A proporção no mercado brasileiro, para ela, tem “números grotescos” na questão de gênero. “Na minha percepção, de 1 a 10, estamos no nível 3. Melhorou um pouco, mas ainda está longe do que seria o ideal”, avalia. Ela diz que entidades setoriais como a Abrint podem fazer a diferença ao pautar o assunto. “É um alerta meio geral: é importante passar que não é coisa só de cultura, mas de formação. Não ter diversidade empobrece o discurso. A área perde.”

“A mulher por si só já se cobra mais. A questão de autoconfiança no mundo corporativo é importante, ainda mais no mundo de TIC. É difícil uma mulher pedir aumento”, declara a vice-presidente de marketing, comunicações e relações institucionais da Ericsson, Georgia Sbrana. Ela argumenta que há uma diferença de comportamento que leva os homens a se sentirem mais confortáveis e hábeis a pedir aumento, enquanto a mulher adotaria uma postura de esperar receber a recompensa salarial. Até mesmo para se candidatar às vagas, haveria uma diferença. “Homens se aplicam para vagas mesmo não cumprindo todos os requisitos. A mulher tenta cumprir 100%.”

Georgia Sbrana, VP de marketing, comunicações e relações institucionais da Ericsson

Naturalmente, isso é apenas uma parte do problema. A responsabilidade por dar as oportunidades iguais ainda é o principal fator. Sbrana diz que há um “unconscious bias” (tendência inconsciente) em questões não apenas de gênero, mas de escolha sexual e de cor. “É uma mudança cultural em um País muito arraigado em relação à cultura do homem, mulher, negro, homossexual. É uma trilha. Mas pensando no nosso setor, nesses quase 20 anos que estou aqui, já mudou muito”.

A mudança acontece simultaneamente na sociedade, com mais espaço para que o assunto apareça na pauta de discussões. Isso tem reflexo no setor. “As mulheres já se posicionam, tem diálogo em casa, na educação, e já cria outra condição e lugar de fala”, destaca a VP de pessoas da Vivo, Niva Ribeiro. “Claro que para ter o efeito que a gente quer, para ver um indicador diferente, leva um tempo. É uma realidade que vai transformar. Hoje temos mais consciência do nosso papel nisso, principalmente os executivos em dar exemplo e realmente mover o indicador”, afirma. “As mulheres têm de se arriscar, tem que ter entrega.”

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