CGI.br critica administração da ICANN e foca na internacionalização da entidade

Entre todas as propostas do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) para a Reunião Multissetorial que acontecerá em São Paulo em abril, a mais contundente envolve a globalização da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers). Na verdade, o assunto é quase uma unanimidade entre as contribuições de entidades, mas a posição que o CGI.br toma no NetMundial é de clara liderança no debate. Tanto que o governo brasileiro, que ainda não submeteu sua proposta até esta sexta-feira, 14, deverá contar com foco idêntico.

Notícias relacionadas
"A ICANN precisa ser completamente internacionalizada e tem de desenvolver um roteiro válido para responsabilização tanto vertical quanto horizontal", declara o comitê brasileiro. É importante notar que, contrário ao que sugeriu o ministro Paulo Bernardo nesta semana para a proposta do governo, a entidade brasileira não utiliza em momento algum o termo "globalização", optando por "internacionalização". Não obstante, a proposta é a mesma: manter a integridade da autoridade, mas a deixando livre das amarras exclusivas do governo dos Estados Unidos. O documento diz também que a evolução institucional da corporação norte-americana deve buscar um equilíbrio entre todos os setores de todos os países.

O documento deixa claro que a ideia não é destituir os poderes da empresa, atualmente com forte ligação com o governo dos Estados Unidos. O órgão brasileiro reconhece a importância da ICANN para a manutenção do ecossistema de governança da Internet para o cadastro dos domínios e números, "incluindo o espectro inteiro das funções da IANA (Internet Assigned Numbers Authority, entidade que coordena DNS, endereço de IP e outros protocolos e é controlada pela ICANN)". Dito isso, apenas a internacionalização de todas as funções (não apenas a alocação e registro de endereços IP) da empresa não teria o efeito necessário sem que haja a substituição do atual contrato com o governo norte-americano (Compromisso de Afirmação), removendo a subordinação direta ou indireta ao sistema legal dos EUA. "Em termos realísticos, a meta pode ser atingida em um intervalo de cinco a dez anos, seguindo a sequência de passos que ainda serão determinados, após o roadmap para o ecossistema internacional de governança que deverá ser definido em fóruns como o próprio NetMundial e o IGF (Fórum de Governança de Internet, entidade controlada pela ONU)".

O CGI.br explica que a migração da distribuição de blocos IPv4 e IPv6, coordenada pelos Regional Internet Registries (RIRs) e pela Number Resource Organization (NRO), é um exemplo de como funções da IANA podem ser descentralizadas e delegadas sem remover a responsabilidade institucional da ICANN. Especificamente, diz o documento, será "extremamente relevante decidir qual entidade, ou conjunto de entidades, vão se tornar responsáveis por gerenciamento do perfil de zona de raiz (lugar onde os sistemas de domínio são administrados) para garantir a estabilidade, segurança e confiança". Dessa forma, o órgão sugere delegar a tarefa para entidades internacionais que já são responsáveis por outros aspectos de governança de Internet (de maneira similar à estrutura RIRs/NRO para os protocolos) e que possuam a qualificação técnica requerida. O documento não sugere, mas o próprio CGI.br poderia ser uma dessas entidades.

Críticas

O texto considera que a responsabilidade (o CGI usa o termo accountability) da ICANN precisa representar o interesse público e de todos os usuários, em vez apenas do contrato e estatuto norte-americanos. A solução mais apontada, segundo o órgão, é de delegar a fiscalização para entidades fora da ICANN, "desde que elas sejam reconhecidas como representantes de um interesse público internacional". A vantagem, diz o comitê, é que isso evitaria a sobreposição de responsabilidades de estabelecer políticas e de fiscalizá-las.

O CGI diz ainda que o esquema de governança da ICANN pende entre a anarquia e hierarquia de acordo com forças políticas e econômicas e a imposição de restrições da diretoria do comitê consultivo governamental (GAC). "Exemplos do problema são: inadequação do mecanismo de participação dos governos via GAC; pouquíssima influência da sociedade civil nas decisões finais do GNSO (Generic Names Supporting Organization) e da diretoria; e a captura da ICANN pela indústria de domínios (tanto registrantes quanto registradores). A esse problema adicionamos a falta de balanço entre diferentes países, no qual países em desenvolvimento (governos e representantes da sociedade civil e de setores privados) possuem pouquíssima influência no ciclo de políticas."

Dessa forma, o Comitê Gestor sugere uma série de "pontos de partida para discussões", entre eles a participação maior de representantes do governo nos processos de desenvolvimento de políticas do GNSO. Entretanto, aconselha evitar a influência governamental nessas políticas durante a deliberação final por representar "vantagem indevida sobre outros grupos setoriais". Outro ponto é reduzir o peso de registrantes e registradores nesses processos, atualmente na mesma medida de outros setores embora não tenham representação tão abrangente.

Revisões

O CGI também afirma que o papel do comitê consultivo At-Large Advisory Committee (ALAC) deve ter a estrutura e o papel revisados, já que a entidade seria redundante no GNSO, mas não teria parte no processo de desenvolvimento de políticas. "Além disso, a participação de indivíduos e entidades no ALAC nem segue regras transparentes nem garante uma representação global adequada dos usuários", afirma o documento brasileiro.

Para o Comitê Gestor de Internet no Brasil, fundos "suficientes" deveriam ser direcionados para promover participação de grupos setoriais de países em desenvolvimento. Além disso, mecanismos deveriam ser implantados para garantir a participação efetiva de organizações, comitês e grupos de trabalho da ICANN.

A proposta também é de reformular a mesa de diretoria da ICANN para melhor representar os grupos setoriais. "Em particular, para reforçar sua natureza multissetorial, o número de cadeiras do board alocadas pelo NomCom (Nominating Committee) deveria ser reduzido, assim aumentando as vagas para membros do board diretamente eleitos pelos SOs (sistemas organizacionais)." Isso inclui também o papel da mesa na aprovação final de políticas. "O board só deveria ter um papel fiscalizador sobre todos esses processos, de forma a garantir que sigam o balanço adequado entre todos os grupos setoriais e que o interesse público tenha sido servido." Além disso, a responsabilidade e transparência deveriam ser melhoradas, na sugestão da entidade brasileira, permitindo à sociedade conferir a consistência das ações da diretoria.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!