A Anatel vai coordenar, daqui para frente, o esforço junto aos operadores de telecomunicações para viabilizar a migração das redes para o IPv6, o protocolo de Internet em sua versão mais atual que permite uma quantidade muito maior de endereços. A decisão foi tomada esta semana durante reunião do NIC.br com presença de representantes das operadoras, provedores de conteúdo, associações setoriais, Anatel e outros agentes do setor de Internet. Durante a reunião, as próprias operadoras perceberam que o trabalho que estava sendo conduzido na esfera do Comitê Gestor de Internet, do qual o NIC.br é o braço de execução, não estava chegando a um bom termo. O problema é que em maio devem se esgotar os estoques existentes de endereçamento IPv4 disponíveis para o Brasil e gerenciados pelo NIC.br. É fato que há vários anos o NIC.br tem alertado para o problema da escassez de endereços e tentado costurar um termo de compromisso que fixasse datas para que as operadoras e provedores de conteúdo adotassem o endereçamento IPv6 de forma definitiva e generalizada. O problema é que a mais recente versão do termo de compromisso não conseguiu sequer conciliar um cronograma final de transição.
Durante a reunião, que aconteceu esta semana justamente para discutir o termo de compromisso, ficou claro que a negociação estava em um impasse e as próprias operadoras indicaram que seria necessária uma intervenção da Anatel. A agência, segundo relatos de pessoas presentes à reunião, colocou a preocupação de que a migração para o IPv6 por parte das operadoras é uma questão que interfere diretamente nas redes de telecomunicações, sendo, portanto, papel dela intermediar esse trabalho. Não é a primeira vez que a Anatel se envolve em uma questão entre as operadoras e o NIC.br. A agência já havia intermediado a questão do bloqueio da Porta 25, uma medida necessária para bloquear o tráfego de spams, mas que enfrentava, inicialmente, a resistência das operadoras.
As reuniões na Anatel devem começar a acontecer nas próximas semanas. O que a agência e as operadoras deverão estabelecer é um cronograma e procedimentos para uso de recursos paliativos para assegurar a otimização do estoque de IPv4 hoje existentes. Especialmente a adoção de técnicas de NAT, procedimentos que permitem o compartilhamento de endereços IPv4 únicos entre vários usuários. A adoção dessas técnicas permite ampliar a quantidade de usuários em uma mesma base de endereços IP, mas ao custo de dificultar o endereçamento das redes, dificultar o rastreamento do tráfego por autoridades policiais e outros problemas de desempenho técnico. É um procedimento que o NIC.br não recomenda, mas que, dada a proximidade do esgotamento dos endereços existentes, tornou-se inevitável. O esforço da Anatel terá que ser no sentido de convencer as operadoras de que essa não pode ser uma solução permanente. O NIC.br, por sua vez, terá que trabalhar junto aos provedores de conteúdo para assegurar que os logs de acesso sejam registrados adequadamente mesmo com o uso de técnicas de NAT paliativas.
Há ainda a questão da certificação dos equipamentos de Internet. O NIC.br chegou a trabalhar em um modelo que assegurasse que os equipamentos para uso em redes de Internet fossem, necessariamente, compatíveis com IPv6. Mas no caso das redes de telecomunicações, a certificação desses equipamentos precisam obrigatoriamente passar pela homologação da Anatel, por força de lei. Já existe um grupo de trabalho dentro da agência finalizando os procedimentos para assegurar que daqui para frente não sejam mais certificados equipamentos não compatíveis com IPv6.
Mais endereços
Na mesma reunião do NIC.br em que ficou decidido que a coordenação da migração para IPv6 por parte das teles será coordenada pela Anatel, também se discutiu o problema da falta de endereços IPv4 em si e como o Brasil poderia ter lidado com a questão. Há muito tempo as operadoras brasileiras, que dependem da liberação desses endereços pelo NIC para poderem vender seus serviços de banda larga, se queixam que o País não fez nenhum esforço para tentar mitigar a falta de endereços IP e pleitear um estoque maior junto aos organismos que distribuem os endereços no mundo, o que segundo elas foi feito por outros órgão similares ao NIC.br. De um tempo para cá, surgiu um mercado paralelo de endereços IPv4 e inclusive algumas operadoras estabelecidas no Brasil já foram procuradas por intermediários que vendem lotes de endereços IPv4 originalmente destinados a outros países, o que é absolutamente fora do padrão e dos princípios de gestão da rede de Internet, mas que já está acontecendo dado o valor que os endereços adquiriram nesse cenário de escassez. Após esses relatos, o NIC.br se comprometeu a buscar algumas alternativas.
Até o fechamento desta reportagem, o NIC.br ainda não havia respondido aos pedidos para entrevista a fim de dar o posicionamento oficial do Comitê Gestor de Internet sobre as questões tratadas na reunião.