Estudo da Anatel aponta desafios para regular agentes econômicos da Internet

Foto: analogicus/Pixabay

Um estudo técnico realizado pela Superintendência de Competição da Anatel aponta os desafios regulatórios que a "economia da atenção" (ou seja, as over-the-top – OTTs) coloca para o setor de telecomunicações e mercados regulados. O primeiro deles mostra a dificuldade de se criar regras regulatórias para novos agentes da economia digital que adentraram no mercado de telecomunicações e prestam serviços similares ao que prestam as operadoras, mas que nascem sobre uma perspectiva de livre regulação, sem atuação estatal.

No capítulo que envolve o tema da economia da atenção, o servidor da SCP Andrey Ribeiro Nunes mostra que outra dificuldade existente nesse mercado, que evolui a partir da experiência do usuário, reside na crescente dificuldade de se definir com clareza os limites, não apenas entre os distintos serviços de telecomunicação, mas dos próprios contornos das atividades que podem ser enquadradas como serviço de telecomunicação.

Isso coloca para o regulador, diz Nunes, o desafio de se pensar como combinar esses dois ambientes, um oriundo de um modelo tradicional e regulado, com outro que surge de maneira disruptiva, que afeta sobremaneira modelos de negócios, práticas de se atingir o público e formatos de consumo de conteúdos.

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A distribuição de conteúdos

Nunes mostra que o conteúdo passou por um processo de virtualização das etapas de armazenamento e distribuição, com destaque para o papel da Internet como principal plataforma dessas transformações, o que reduziu drasticamente os custos da cadeia de valor deste conteúdo.

Ele lembra que na época do broadcasting, materializada pela experiência da televisão, os anúncios ou os conteúdos tinham metas de alcançar o maior número possível de pessoas. Isso não significava, no caso dos anunciantes, que todas as pessoas atingidas serão potencialmente consumidoras daqueles produtos anunciados e, no caso dos conteúdos, que todos os estariam assistindo. Era um mercado de atenção regrado pelo alcance.

"Tome-se como exemplo a precificação do horário nobre: ainda que sua audiência média seja superior ao do restante da programação, não há garantia para o anunciante de que sua oferta vá alcançar, de fato, o consumidor potencial, apenas a probabilidade de que esse casamento ocorra é maior. Embora o mercado publicitário conte com estatísticas e estudos que permitam certo mapeamento do público-alvo de cada transmissão, a própria natureza de broadcast do sinal – centralizada e uniforme, para recepção geral – limita sobremaneira a customização da publicidade e, por consequência, sua eficácia", diz Nunes.

A segmentação da programação

Ainda nesse caso de um emissor para vários receptores, entra em cena a TV por assinatura, que muda o mercado do foco. "A introdução da TV por assinatura avançou significativamente o processo de customização do conteúdo. O confinamento do sinal em cabos permitiu a transmissão simultânea de número de canais muito superior àquele tecnicamente factível no âmbito da radiodifusão. A TV fechada, em função dessa abundância de capacidade informacional, podia oferecer uma segmentação inédita da programação, contando com canais voltados a todos os perfis dos moradores da residência, atendendo desde o público infantil até entusiastas de esportes", diz Nunes no estudo da Superintendência de Competição.

Nesse ponto, prossegue o autor, ocorre uma primeira transformação do mercado do foco. "A especialização da programação, ainda que interessante do ponto de vista do anunciante, impede que a TV fechada opere na mesma escala da radiodifusão. Do prisma da produção, por exemplo, a ocupação de toda a grade horária dos diversos canais exige uma multiplicação de investimentos. Frise-se, ainda, o caráter incerto do êxito de qualquer produção, dada a inexistência de fórmula garantida na conquista da simpatia do público", prossegue Nunes.

Mas a Internet traz uma nova onda para o mercado do foco, cuja estratégia coloca a atenção sob uma nova perspectiva. A proposta não é somente atingir pessoas, mas criar ferramentas e estratégias que façam com que os usuários dediquem atenção, de pelo menos, 9 segundos, diz Nunes, sejam nos conteúdos ou nas publicidades.

Entram em jogo dois outros atores: os algoritmos e o machine learning. A partir de agora, a publicidade e conteúdos são direcionados para públicos específicos, onde seu consumo não acontece mais de maneira aleatória. Há um direcionamento, muito pautado pela experiência do usuário e na forma de consumo, na publicidade e nos conteúdos.

Ao mesmo tempo, proliferou o número de fontes de informações, o que torna a competição pela atenção mais acirrada. "Na esteira, pode-se dizer que houve uma horizontalização da competição do conteúdo: o consumidor diante de uma tela de celular não precisa necessariamente selecionar um canal da grade para dedicar seu tempo e foco, podendo optar livremente entre atividades tão diversas quanto assistir a um programa de televisão, ler um livro, jogar uma partida em rede ou trocar mensagens com amigos e familiares", afirma Nunes.

Nesse cenário, conforme apontado pelo estudo encabeçado pela Superintendência de Competição da Anatel, deve-se garantir instrumentos regulatórios e legais que combinem a coexistência desses dois ambientes econômicos, mantendo novos serviços juntos com serviços já amplamente regulados.

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