Juiz estranha "surpresa" com procedimentos da Satiagraha

O depoimento do juiz da 6ª Vara Criminal de Justiça de São Paulo, Fausto De Sanctis, na CPI das Interceptações Telefônicas Clandestinas, surpreendeu os presentes, não pelas informações sobre a Operação Satiagraha, mas pela sua postura frente aos questionamentos dos deputados. Logo no início da sessão, Sanctis recusou uma proposta do presidente da CPI, deputado Marcelo Itagiba (PMDB/RJ), de que parte da reunião fosse fechada para preservar as informações sigilosas da investigação. "Eu não vou fazer sessão reservada. Tudo o que eu tenho a dizer é de forma aberta. E o que eu não puder falar continuará sendo sigiloso", afirmou o juiz logo em sua fala inicial. Na semana passada, os deputados já haviam ouvido a mesma recusa do delegado da Polícia Federal, Protógenes Queiroz.
Munido de uma apresentação em power point – distribuída em cópias impresas apenas aos deputados -, De Sanctis tentou contribuir para o foco original do trabalho da comissão: o debate sobre as interceptações telefônicas no Brasil. Mas a maior parte das perguntas continha alguma referência à Operação Satiagraha, onde foram presos o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta. Invocando a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), que impede juízes de se pronunciarem sobre processo em andamento, De Sanctis não respondeu a estes questionamentos.
O juiz defendeu o uso das interceptações pela Justiça como forma de colaborar com as investigações e criticou a iniciativa de limitar o tempo de uso das interceptações telefônicas. Com relação aos grampos ilegais, De Sanctis revelou que, em muitos casos analisados, essas interceptações são feitas por funcionários de empresas de telefonia e não por agentes da Justiça.

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Ainda com relação às operadoras telefônicas, o juiz criticou a postura dessas empresas, que em alguns momentos dificultam a investigação. "Teve caso de ligar para uma companhia telefônica e onde eu caí? Naquelas ligações telefônicas em que um passa para o outro e eu ficava falando: 'Estou ligando da Justiça. Preciso de uma informação urgente'. Não adiantou. O que eu tive como resposta? Não tive resposta nenhuma. Eles são os donos de si e agem por conta própria", protestou.

Surpresa

De Sanctis foi crítico também com relação ao interesse, neste momento, de reavaliar os procedimentos da Justiça nas operações policiais. "Sempre se fez tudo isso", afirmou o juiz, referindo-se aos grampos e outros procedimentos de quebra de sigilo usados na investigação. "Não pode causar tanta surpresa como causou nesse caso em especial", complementou.
Os comentários recorrentes na CPI de que "todos no País estão grampeados" foi visto com ceticismo pelo juiz. "Todo mundo acha hoje que está sendo monitorado. Que é isso? É uma síndrome do pânico. Vamos parar com isso."

Mendes

O juiz negou que tenha autorizado a realização de qualquer tipo de grampo nas dependêncas do Supremo Tribunal Federal (STF) para monitorar o ministro-presidente Gilmar Mendes e respondeu com rispidez às perguntas dos deputados sobre o tema. "Eu, em nenhuma hipótese, nunca cogitei e nunca admitirei monitorar qualquer pessoa que tenha prerrogativa de foro, leia-se desembargador de tribunal e ministro do STF. Eu não fiz isso e nunca farei. Essa é a verdade, acreditem ou não. Qualquer estudante de segundo ano de uma faculdade de Direito sabe os limites de competência jurisdicional de um juiz. E não ia ser diferente comigo", afirmou.
De Sanctis esclareceu o teor da conversa que teve com a desembargadora Suzana Cabral, vice-presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª região, em São Paulo. Segundo matérias publicadas na imprensa, o diálogo conteria uma suposta confissão de que o monitoramento do STF foi realizado. O juiz negou que a conversa tenha sido sobre este tema e disse que a desembargadora entrou em contato apenas para saber se era verdadeira a informação de que a 6ª Vara expediria novo mandato de prisão contra Daniel Dantas.
No diálogo, Suzana teria dito que o ministro Gilmar Mendes estaria "irado" com a iminência da segunda prisão, de acordo com o relato feito pelo juiz aos deputados. O entendimento de De Sanctis é que o contato da desembargadora seria com intenções positivas, com o intuito de evitar atritos entre o juízo de primeira instância e o Supremo. Ela teria dito que sua iniciativa era para evitar que a questão se transformasse em uma briga "pessoal".

Vazamentos

O vazamento de informações da Operação Satiagraha foi condenado pelo juiz, que garantiu que os documentos não saíram pela 6ª Vara. Os arquivos divulgados pelo site Consultor Jurídico – citado pelo juiz apenas como "um site" – conteriam informações que não estão na Justiça e, portanto, não poderiam ter saído da vara de sua responsabilidade.
Com base em casos anteriores, De Sanctis defendeu que a maior parte dos vazamentos é feita pelas próprias partes nos processos. "Os vazamentos têm ocorrido a partir de se dar cópias às partes", afirmou. Em alguns casos, a atitude teria inclusive o objetivo de "desmerecer o trabalho da polícia ou do próprio Judiciário".
Com relação ao trabalho da imprensa no dia das prisões, De Sanctis resumiu sua impressão em uma frase: "Quem foi mais esperto, saiu atrás e fez as reportagens". Ele contou que "todos" os repórteres de São Paulo sabiam da operação com antecedência, o que o levou, inclusive, a acreditar que a Satiagraha não conseguiria ser deflagrada.
De Sanctis disse que acredita ser vítima de uma tentativa de destruição da sua imagem, mas não quis revelar da parte de quem. "Não vou falar quem são os autores, mas que isso existe, existe sim." Ao se ver pressionado para revelar os nomes dos interessados em macular sua imagem, o juiz retrucou com veemência. "Vamos parar de fazer fofocas e ir direto ao tecnicismo", afirmou, resumindo a tônica de grande parte de suas respostas durante sua passagem pela CPI.

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