ANPD nega recurso da empresa que realizava coleta de íris em troca de criptomoedas

Foto: Gerd Altmann/Pixabay

O Conselho Diretor da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) indeferiu na terça, 11, o recurso administrativo apresentado pela empresa Tools For Humanity (TFH), responsável pelo projeto World ID, que coletava imagens da íris de usuários mediante pagamento.

A decisão do colegiado, que acatou voto da relatora do recurso Miriam Wimmer, mantém a suspensão da concessão de compensação financeira, seja em criptomoeda (WorldCoin – WLD) ou em qualquer outro formato, para identidades digitais (World ID) criadas pela coleta de íris de titulares de dados pessoais no Brasil.

No recurso, a empresa havia solicitado prazo adicional de 45 dias para implementar mudanças no aplicativo e interromper a oferta de compensação financeira, mas o pedido foi negado. O Conselho Diretor entendeu que a suspensão do pagamento pode ser realizada por outros meios, incluindo o adiamento dos agendamentos, até que o ajuste no aplicativo seja efetuado.

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Dessa forma, a suspensão da compensação financeira associada à coleta de íris deverá ser realizada imediatamente após a intimação.

No seu voto, Wimmer destacou que a compensação financeira oferecida pela empresa configura uma interferência indevida na livre manifestação de vontade dos titulares de dados. Ainda de acordo com o voto, a fim de atender a necessidades financeiras imediatas, o titular muitas vezes considera o atrativo financeiro como um fator determinante para autorizar a coleta de sua íris, ignorando os riscos envolvidos e a própria finalidade da coleta.

Autodeterminação informativa

Por isso, ressaltou, a atuação da ANPD é essencial para assegurar a autodeterminação informativa dos titulares e garantir o direito de manifestação livre, informada e inequívoca em relação ao tratamento de seus dados pessoais.

A TFH tem 10 dias úteis, contados a partir da notificação, para apresentar uma declaração oficial assinada por um responsável legal, atestando a suspensão da compensação financeira. Além disso, as demais orientações estabelecidas anteriormente pela ANPD, como definidas na decisão da Coordenação-Geral de Fiscalização permanecem em vigor.

A decisão reforça o compromisso da ANPD com a defesa dos direitos fundamentais de privacidade e a proteção dos dados pessoais, garantindo que essas prerrogativas sejam respeitadas nas atividades de tratamento de dados pessoais no País.

Na avaliação de Bruno Marcolini, advogado do Andersen Ballão Advocacia, perante a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a íris de um ser humano é o que nós chamamos de dados pessoais sensíveis, ou seja, dados previstos em lei cujo o tratamento está atrelado ao seu grande potencial discriminatório.

Nesse caso, o advogado destaca que este tipo de dado se enquadra em uma categoria ainda mais única, o dado pessoal biométrico. "O tratamento dessa categoria permite a autenticação de identidade de indivíduos de maneira única, uma vez que usa de suas características físicas e biológicas personalíssimas", explica.

Ele também chama a atenção para o fato de que a maior ameaça em relação ao tratamento de dados pessoais biométricos é justamente a possibilidade de uso posterior discriminatório, atrelados ou não à finalidade original descrita pela empresa (identificação e segurança).

O caso

Em janeiro, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) decidiu aplicar medida preventiva à empresa Tools for Humanity (TFH) para suspender a oferta de criptomoeda ou de qualquer outra compensação financeira pela coleta de íris de titulares de dados no Brasil. Na ocasião, determinou à TFH que indique em seu site a identificação do encarregado pelo tratamento de dados pessoais.

Em novembro de 2024, a ANPD, por meio da Coordenação-Geral de Fiscalização (CGF), instaurou processo de fiscalização para analisar o tratamento de dados biométricos para fins de criação da chamada World ID. Segundo a empresa, a World ID permitiria a comprovação de que o titular é um ser humano único vivo e promoveria maior segurança digital em contexto de ampliação das ferramentas de inteligência artificial.

Em análise preventiva, a Coordenação-Geral de Fiscalização entendeu que a concessão de contrapartida pecuniária pela empresa, por meio da oferta de criptomoedas, pode prejudicar a obtenção do consentimento do titular de dados pessoais. O órgão diz que na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o consentimento para o tratamento de dados pessoais sensíveis, como é o caso de dados biométricos, precisa ser livre, informado, inequívoco e fornecido de maneira específica e destacada, para finalidades específicas.

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