O procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, encaminhou nesta segunda-feira, 11, ao Supremo Tribunal Federal (STF), ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra as Leis nº 14.790/2023 e nº 13.756/2018, por não atenderem a requisitos mínimos de preservação de bens e valores da Constituição Federal. As duas legislações permitem a exploração e a divulgação das bets em eventos esportivos e em eventos de jogos on-line.
Segundo o PGR, "a legislação é insuficiente para proteger direitos fundamentais dos consumidores, em face do caráter predatório que o mercado de apostas virtuais ostenta". Ele acrescenta que o instrumento previsto em lei para admitir a exploração de loterias pelo Estado é constitucionalmente impróprio.
Além das leis federais, a ação pede a inconstitucionalidade do conjunto de portarias editadas pelo Ministério da Fazenda que regulamenta a modalidade de apostas de quota fixa. Essa modalidade consiste em sistema de apostas em torno de eventos reais ou virtuais em que é definido, no momento da efetivação da aposta, quanto o apostador poderá ganhar no caso de acerto.
A ADI da PGR foi apresentada no mesmo dia em que o STF realizou audiência pública para coletar subsídios para julgar a ADI 7721, de autoria da Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que pede a inconstitucionalidade da Lei das Bets (Lei nº 14.790/2023). Segundo a CNC, os sites de apostas esportivas têm comprometimento a renda dos brasileiros, reduzindo o consumo de bens e serviços no país.
Contra direitos sociais
Paulo Gonet argumenta na ação que a legislação das bets fere direitos sociais à saúde e à alimentação, direitos do consumidor, de propriedade, da criança e do adolescente, do idoso e da pessoa com deficiência. "Entra em linha de choque com princípios da ordem econômica e do mercado interno e com o dever do Estado de proteção da unidade familiar. Além disso, despreza a imposição constitucional de outorga de serviços públicos por concessão ou permissão, mediante licitação. Desvia-se, igualmente, de restrições constitucionais à propaganda de produtos de alto risco para a saúde", argumenta.
A Lei nº 13.756/2018 instituiu a nova modalidade de apostas e dispôs sobre a destinação de parte dos recursos, mas não regulamentou a aposta virtual. Esse novo mercado surgiu sem critérios de proteção dos usuários do serviço e do mercado nacional. Como agravante, explica o PGR, os sites e operadores estão, muitas vezes, sediados em outros países, o que dificulta a aplicação da legislação brasileira, diminuinfo o controle e a fiscalização, bem como a tributação da atividade. Já a Lei nº 14.790/2023 teve o intuito de diminuir impactos sociais negativos do novo mercado, mas não foi suficiente, segundo Gonet.
Na ação, a PGR pede a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei nº 14.790/2023, que tratam da modalidade das apostas de quota fixa, quanto dos artigos 29 a 33 da Lei nº 13.756/2018, que instituíram a nova modalidade de apostas. O procurador-geral da República também faz pedido cautelar (decisão liminar provisória) para que as normas questionadas tenham a eficácia suspensa, com a consequente proibição das bets.
Controvérsia
No primeiro dia de audiência realizada pelo STF nesta segunda-feira, 11, os debates apontaram opiniões divergentes sobre o caso das bets. A CNC apresentou uma série de estudos, entre eles, os dados que demonstram o crescimento descontrolado das apostas no país, com impacto negativo no padrão de consumo da família brasileira.
O advogado-geral da União defendeu a legislação criada no governo Lula, dizendo que a lei 14.790/2023 trouxe novas regras para a exploração dessas bets. "As apostas se disseminaram de maneira vertiginosa e permaneceram por um período considerável sem regulação. A permissão de jogos de azar, ainda que amparada com capacidade da União em legislar, impacta no cidadão, em áreas como o direito à saúde, a proteção de crianças e adolescentes", disse.
Para a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), os sites de apostas online possuem regras que deixam claro o seu funcionamento legal no Brasil, já previsto na Lei 14.790/2023. Dessa forma, não há que se falar em inconstitucionalidade da legislação.
Gustavo Binenbojm, diretor da entidade, destacou que a legislação que a CNC quer que seja declarada como inconstitucional prevê regras de publicidade que garantem ao cidadão a capacidade de fazer apostas de maneira segura, e que são seguida por emissoras de televisão e agências de publicidade.