Censo Escolar 2024 expõe disparidades no acesso à tecnologia e Internet

Imagem: Divulgação/American Tower

O Ministério da Educação divulgou esta semana os resultados do Censo Escolar de 2024, incluindo um panorama sobre a infraestrutura tecnológica das escolas brasileiras. Os dados ainda revelam disparidades significativas no acesso a recursos para a educação digital.

O acesso à Internet está disponível para 90,2% das escolas de ensino fundamental e para 97,1% das escolas de ensino médio, mas os resultados mostram diferenças entre as redes de ensino (federal, estadual, municipal e privada), regiões do País e localidades específicas como comunidades quilombolas e indígenas, nas duas etapas da educação. 

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Mas os dados também devem ser analisados considerando uma ressalva temporal de implementação das últimas políticas aprovadas, já que a coleta de dados para elaboração do Censo foi realizada no primeiro semestre de 2024 e não reflete ainda o avanço de novos esforços para universalização do acesso aos recursos tecnológicos nas escolas.

Ensino Fundamental

No total, a média nacional de acesso à Internet fica em 90,2% no ensino fundamental. Os dados mostram que 100% das escolas privadas e federais na etapa possuem o recurso, em patamar que cai para 93,7% nas estaduais e 86,3% nas escolas municipais no fundamental.

Na região Sul e no Centro-Oeste, os registros são de 99%, enquanto no Norte do País o acesso à Internet chega a somente 63,7% das escolas.  Os dados do Censo consideram acesso em qualquer velocidades; quando avaliado apenas o acesso à Internet banda larga (que permite altas velocidades), o patamar cai em todas as regiões, de seis a 20 pontos percentuais.

Além disso, as escolas que disponibilizam computador de mesa para alunos são apenas 24,9% no Norte e 40,5% nas escolas municipais, uma diferença significativa em pontos percentuais se comparada a parcela 66,6% registrados no total das escolas de ensino fundamental. 

A análise por localização mostrou que apenas 80,9% das escolas quilombolas de ensino fundamental possuem acesso à Internet, em contraste com 44,1% das escolas indígenas. Quando se trata de acesso a outros recursos como lousa digital e projetores multimídia, a distância entre as realidades também é expressiva nas diferentes regiões do País.

Ensino Médio

No ensino médio, os contrastes continuam. Ao todo, o acesso à Internet está disponível em 97,1% das escolas na etapa, com vantagem para federais e privadas (quase a totalidade das escolas conectadas) ante as estaduais, com 95,9%. As escolas estaduais representam a maior parcela de escolas nesta etapa da educação. 

Se a análise for de Internet banda larga (que permite altas velocidades), o índice cai para 82,9% nas mais de 20 mil escolas estaduais de ensino médio pesquisadas no Censo. 

A diferença entre as regiões do País também se repete nesse nível de ensino: o Sul, Sudeste e Centro-Oeste registram 99,9% de acesso à Internet nas escolas de ensino médio, enquanto o Norte fica com apenas 78,2%.

Destaca-se também que o Sudeste entrega cobertura com Internet banda larga em 97,3% de suas escolas, enquanto o Norte tem 66,9%, o Sul, 76% e o Nordeste, 83,2%, segundo o Censo.

Nas escolas quilombolas de ensino médio, 91% tem acesso à Internet, 62.2% à banda larga e 77,7% possuem computadores para os estudantes. O número é inferior à média nacional, mas acima dos observados nas escolas indígenas. Os dados apontam que, apesar dos avanços em conectividade e equipamentos, a inclusão digital ainda não é uma realidade uniforme em todo o País.

Análise

Head de políticas públicas & articulação política da MegaEdu, organização do terceiro setor que trabalha para conexão de escolas públicas do Brasil à internet de qualidade, Liana Figueiredo entende que houve avanços no acesso á conexão e modernização tecnológica das escolas, mas destaca que ainda existem entraves, inclusive burocráticos. 

Figueiredo também descreve um cenário dinâmico em relação à tecnologia nas escolas. Em sua visão, o Censo Escolar 2024 ainda não reflete os avanços mais recentes devido ao período de coleta de dados, mas há uma perspectiva de melhora nos próximos anos, impulsionada por políticas públicas.

Liana pontua que houve uma evolução da pauta de educação conectada nos últimos anos no cenário político, com a disponibilização de recursos, a disposição para um compromisso político com a universalização da conectividade no País, publicação de editais e contratações.

No entanto, as contratações significativas ocorreram no segundo semestre de 2024, após a coleta de dados do Censo (que aconteceu por volta de maio). Portanto, a organização já não esperava uma grande transformação nos indicadores de tecnologia do Censo 2024. A expectativa é que o Censo de 2025 reflita o impacto das políticas e contratações realizadas.

"Tem políticas que, sim, estão olhando, por exemplo, para acesso, especialmente, como a política do Aprender Conectado, executada pela EACE. É o tipo de coisa também que ainda não aparece no Censo de 2024 e deve aparecer necessariamente no próximo. É bem importante que esse Censo seja observado com essa ressalva", argumenta.

Apesar dos avanços, a representante da MegaEdu também acredita que o ritmo das políticas precisa aumentar para alcançar o compromisso de universalização da conectividade no ensino. "Está escalonando, de fato está aumentando bastante, mas para cumprir a universalização assumida pelo Governo Federal temos que aumentar um pouco o ritmo", afirma.

A MegaEdu ainda realizará uma análise completa do Censo 2024, que trará análises de contexto, detalhando os editais, recursos e escolas envolvidas, para uma compreensão mais aprofundada dos dados. A nota técnica terá um tom técnico e construtivo, visando impulsionar a pauta da modernização tecnológica.

Compras

Segundo a MegaEdu, contudo, ainda há uma ausência de referencial claro sobre as necessidades de dispositivos para uso pedagógico. Acrescenta-se a isso o fato de que municípios com menos de 200 mil habitantes, que representam a maioria das cidades, frequentemente carecem de estrutura adequada para aquisições, incluindo a formulação de processos e a compreensão de especificações técnicas.

Recentemente, o MEC publicou um guia com um referencial de dispositivos, não como um parâmetro rígido, mas como uma orientação de boas práticas alinhada ao projeto político-pedagógico da escola. A MegaEdu colaborou com a Entidade nesse guia, identificando a necessidade de ferramentas práticas para as redes.

Para auxiliar as escolas, eles desenvolveram uma calculadora de dispositivos (baseada no referencial do MEC e dados do INEP) e minutas de contratação (com base em experiências bem-sucedidas).

Uso da Internet pelos alunos

O uso da Internet também é diferenciado no Censo de acordo com diferentes fins: há dados sobre Internet para uso pelos alunos, Internet para ensino e aprendizagem e Internet para uso administrativo.

A disponibilização de acesso à Internet para alunos, por exemplo, aconteceu em 48,8% das escolas de ensino fundamental e em 76,4% das escolas de ensino médio, em 2024.

Esse uso deve sofrer alterações no Censo do próximo ano, considerando a nova regulamentação que proíbe uso de celular nas escolas brasileiras, definida em março deste ano.

Vale lembrar que mesmo com a proibição do uso de celulares por alunos, os dispositivos digitais podem ser admitidos nas escolas para fins pedagógicos e sob mediação dos profissionais de educação, com orientações adequadas. Para outros fins, o uso é vedado em todos os momentos da rotina escolar, inclusive nos intervalos e fora das salas de aula.

Uso pedagógico

Como nos outros marcadores, as discrepâncias também aparecem no uso pedagógico da Internet. Nas escolas de ensino médio, 82,9% oferecem a opção. Nas de ensino fundamental, a média nacional é de 67,1%. 

No ensino fundamental, a região Sul lidera com 89,6% das escolas com Internet disponível para ensino e aprendizagem, enquanto o Norte fica na retaguarda, com apenas 35,8%. Também vale pontuar que a opção só está disponível em 60,6% das escolas municipais. Na educação fundamental em áreas indígenas, são registradas somente 26,9% das escolas.

No ensino médio, também é o Sul que sai à frente, habilitando Internet para fins pedagógicos em 92,8% de suas escolas, enquanto o Norte tem 48,5%. A diferença é menor em pontos percentuais considerando as diferentes redes: 94,6% das escolas federais, 87,3% nas privadas e 80,6% nas estaduais.

Já a educação de indígenas também fica bastante defasada nesse recorte: a Internet para uso pedagógico está registrada em somente 50,9% das escolas de ensino médio com tal perfil.

O Censo

De acordo com o Censo, em 2024, foram contabilizadas 47,1 milhões de matrículas nas 179,3 mil escolas de educação básica no Brasil, cerca de 216 mil matrículas a menos em comparação com o ano de 2023, uma redução de 0,4% no período. A rede pública teve uma redução de mais de 380 mil matrículas, entre 2023 e 2024, enquanto a rede privada expandiu 1%.

Dados identificados no panorama podem definir a necessidade de mais recursos tecnológicos para uma educação digital e podem subsidiar as discussões sobre o projeto do novo Plano Nacional de Educação (PL 2.614/2024), que está em tramitação no Congresso Nacional. O Censo Escolar 2024 indica também que as matrículas na educação em tempo integral da rede pública passaram de 18,2% em 2022 para 22,9% em 2024. 

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