A publicação da portaria do Ministério das Comunicações estabelecendo as diretrizes para que a Anatel elabore a proposta de revisão do modelo de telecomunicações coloca, finalmente, o formulador de políticas e a agência reguladora na mesma página. Demorou para que se chegasse nesse ponto, mas fica claro que um eventual modelo baseado no serviço de banda larga prestado em regime público está afastado e também está decretado o fim do modelo atual de concessões de telefonia fixa e dois de seus pilares (controle tarifário e reversibilidade). Mas permanece, no novo modelo, algo parecido com uma universalização da banda larga, algo que ainda que terá que ser construído.
Dificilmente a proposta da Anatel a este novo modelo se materializará nos decretos necessários antes do final do ano. A novidade é que agora, além de mexer nos contratos atuais e no Plano Geral de Metas de Universalização, será necessária uma nova alteração no Plano Geral de Outorgas. Tudo isso passa por consulta pública, análises do conselho diretor, análise do conselho consultivo, análise do Ministério das Comunicações e análise da Presidência da República. No cenário político atual, é difícil algo desta complexidade ficar pronto antes do final do ano.
Mas como já existem duas propostas na mesa para parte das demandas apresentadas pelo Minicom, é possível encurtar algumas etapas. As propostas do conselheiro Igor de Freitas e Rodrigo Zerbone para a revisão dos contratos e PGMU já trazem, cada uma a seu jeito, soluções para o desafio colocado pelo formulador de políticas. Freitas quer desidratar as concessões de STFC apenas ao essencialmente necessário. Zerbone trouxe a novidade de um serviço convergente e de um modelo que prevê metas de banda larga a serem cumpridas entre o fim do modelo atual e início do novo. Deve prevalecer uma combinação das duas propostas, possivelmente sem a criação de um novo serviço (o próprio Minicom prevê a prestação em um regime único, possivelmente com uma autorização única), mantendo-se a base regulatória atual, cuja alteração seria necessária no caso de um Serviço Convergente. Da proposta de Zerbone, ficaria a ideia de estabelecer as metas a serem cumpridas na transição. Mas permanece o desafio de encontrar um modelo regulatório menos pesado e complexo do que o atual para o conjunto de serviços.
De qualquer forma, a discussão das metas de transição será o grande obstáculo imediato. Não se tem nenhuma ideia concreta dos saldos que ficariam do modelo antigo e que poderiam ser aproveitados no novo modelo (para custear as metas), muito menos das premissas e da metodologia de cálculo desses valores. Essa discussão passa pelo debate dos bens reversíveis, metas existentes que venham a ser flexibilizadas, ônus financeiros futuros da concessão e mesmo futuras receitas com o novo modelo. O que existem até aqui são especulações. Antes de qualquer avanço, será necessário conciliar os interesses do governo (que já tem os seus planos de universalização de banda larga em projeto, e não se sabe se vai querer mantê-los), das empresas (que querem liberar recursos para investimentos) e da sociedade, para só então definir esses parâmetros.
Esse não será o único obstáculo, contudo. Ainda não está claro qual será o nível de regulação exigido no novo modelo. Será mais do que se exige hoje das prestadoras em serviços privados (já considerado excessivo pelas empresas)? As metas de transição serão apenas de cobertura de banda larga ou incluirão algum parâmetro de qualidade de serviços? Como vai funcionar a política de atrelar áreas vantajosas com áreas pouco atrativas considerando-se que hoje, em banda larga, as empresas já estão nos mercados mais relevantes e que a maior concessionária do país em cobertura geográfica, a Oi, tem dificuldades de investimentos? Como ficarão as operadoras que não têm, hoje, nenhuma concessão, como a TIM, a Nextel e a Sky, mas que queiram se beneficiar de um modelo de outorga única? E os serviços de vídeo, continuarão regidos por uma lei separada?
Há também a expectativa de que mesmo os acordos (TACs) que estão sendo desenhados dentro da Anatel para troca dos processos por descumprimento de obrigações (PADOs) em investimento tenham que ser revistos, já que muitas dessas pactuações estavam baseadas em falhas de condutas que não mais serão exigidas (como extensas coberturas com telefones públicos).
E ainda existe o fator Congresso, que tem suas demandas e de quem dependem algumas mudanças importantes no futuro modelo, sobretudo em relação à possibilidade de um regime único para a prestação dos serviços e uso de recursos do Fundo de Universalização de Telecomunicações.
A boa notícia é que agora o roteiro do novo modelo está mais claro e desenhado. Mas o caminho ainda é muito longo.