Neelie Kröes chama rascunho das propostas do NetMundial de "abstrato e vago"

Com duas propostas encaminhadas para o NetMundial, evento que discutirá a governança da Internet no modelo multissetorial e que acontecerá em São Paulo nos dias 23 e 24 de abril, a Comissão Europeia se mostrou como uma das principais forças de apoio às discussões. Entretanto, em carta aberta divulgada nesta sexta-feira, 11, em seu blog oficial no site da entidade, a vice-presidente Neelie Kröes se mostrou insatisfeita com a redação do rascunho com as propostas do Comitê Executivo para o encontro. Segundo ela, que fará parte do Comitê Multissetorial de Alto Nível (HLMS, na sigla em inglês), o texto preliminar foi "abstrato e vago" em pontos importantes ao resumir as 188 propostas recebidas.

Notícias relacionadas
"Lamento dizer que eu achei o rascunho do documento final muito abstrato e vago em se tratando do roadmap proposto. Eu entendo os desafios que o EMC (Comitê Executivo da reunião) teve em fazer um resumo das várias contribuições que foram submetidas, e eu confio que meus comentários sejam tomados como uma contribuição construtiva; mas eu estou convencida que este documento, como está, será interpretado como deixando de lado discussões necessárias – em particular por aqueles que tenham opiniões diferentes sobre o valor e a efetividade do modelo multissetorial", declarou.

Ela se justifica dizendo que não acredita que todos os principais pontos deveriam ser resolvidos em São Paulo, mas que o NetMundial "deveria definitivamente marcar uma significativa 'mudança de ritmo' nas discussões e deliberações que têm acontecido até o momento". Para a vice-presidente da CE, o encontro deveria começar com um ponto muito mais ambicioso. "Eu aprecio que o EMC tenha tentado tirar o máximo das contribuições recebidas. Entretanto, eu acho que a conferência não deveria superestender as áreas que quer cobrir de forma significativa."

Na visão dela (condizente, aliás, com a proposta da Comissão), o documento não deveria sequer tocar em assuntos como neutralidade de rede e inimputabilidade. "Ambos são pontos certamente muito importantes no debate geral de uma Internet aberta, mas são sujeitas a discussões detalhadas em outro lugar", declara. Isso tem uma explicação: a própria Comissão Europeia está promovendo o debate sobre neutralidade na proposta Continente Conectado, assim como no Brasil o assunto é discutido no Marco Civil. "Não deveríamos ser vistos prejulgando o resultado de um procedimento democrático em tópicos tão sensíveis", justifica. Sobre a responsabilidade de intermediários, ela apenas se limita a dizer que é um tema já debatido extensamente em outros fóruns e, em alguns casos, consolidados com legislação, como é o caso da União Europeia.

Linguagem vaga

Neelie Kröes critica a abordagem adotada na redação, especialmente no ponto em que o texto fala que a governança da Internet deve ser "sensível aos direitos humanos". "Temos a obrigação de respeitar e promover os direitos humanos, não meramente sermos 'sensíveis' a eles", reclama, ressaltando ainda que isso inclui pontos como o da proteção à privacidade e aos dados pessoais, que "deveriam ter um papel preponderante no documento".

Outra reclamação é ao modelo proposto de autorregulação e auto-organização entre diferentes setores. Ela argumenta que isso não poderia ser feito em detrimento de princípios democráticos. Neelie explica que basear os processos em "mecanismos publicamente conhecidos" podem resultar em "exclusão explícita ou implícita de pessoas de maneira que poderiam contradizer processos democráticos".

As palavras da vice-presidente da Comissão Europeia não foram todas ofensivas. Ela comemora a importância dada aos modelos institucionais de governança de Internet de forma distribuída, argumentando que está em linha com as propostas da própria Comissão. Da mesma forma, reconhece que o rascunho dedica importância a políticas e ferramentas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) para promover esse modelo.

Por fim, a integrante da Comissão destaca a importância da globalização "real e efetiva" das funções e decisões do núcleo da Internet, ou seja, da globalização da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers) e de funções da IANA (Internet Assigned Numbers Authority, entidade que coordena DNS, endereço de IP e outros protocolos). "Isso talvez seja uma das condições mais essenciais se quisermos que o modelo multistakeholder para governança de Internet seja visto como realmente legítimo no mundo", declara, congratulando o governo dos Estados Unidos pela iniciativa de não renovar o contrato que tem com a ICANN em setembro de 2015, permitindo a entrada do novo modelo multissetorial.

Neelie Kröes pode não ter gostado do rascunho, mas confirmou a presença em São Paulo. "Na minha visão, é absolutamente essencial que façamos um esforço coletivo para garantir que o resultado final do NetMundial seja concreto e possa ser posto em prática, com objetivos claros e com um cronograma realístico, mas ambicioso", declara. A versão final do resultado, aprovada pelo HLMC, deveria ser divulgada nesta sexta-feira, mas até as 20h40, não havia sinal do documento no site do evento.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!