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A corrida secreta da Netflix

O ano começou movimentado para o mercado de TV com o recente anúncio da expansão global da Netflix a 190 países. Saudada como a “primeira empresa global de TV”, a nova estratégia já era esperada e está sendo testada há alguns anos. Tanto é que o próprio CEO da Netflix, Reed Hastings declarou à Tela Viva, que cobriu o lançamento da nova estratégia na CES, em Las Vegas, que a experiência da expansão para mercados como o Brasil seria fundamental nessa nova etapa da Netflix.

Passado o oba-oba inicial, com volumosa cobertura de imprensa e uma reação mais comedida do mercado financeiro, é possível fazer uma leitura ponderada do significado desta nova estratégia. O resumo é simples: pressa.

A Netflix precisa aproveitar o bom momento para ganhar espaço nos mercados em que não está antes que outras empresas o façam. Experiências como a do Brasil, em que a infraestrutura de banda larga é limitada, a renda média é baixa e a competição no mercado de TV paga é acirrada, certamente ajudam a Netflix nessa investida. O mundo tem mercados muito mais desafiadores do que o Brasil, como a Índia.

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O que está determinando a pressa da Netflix é o fato de que os grandes estúdios produtores de conteúdo estão, de um lado, planejando ou lançando serviços próprios, como o HBO Go (Ted Sarandos, chief content officer do serviço de SVOD, chegou a declarar que queria se tornar uma HBO antes que a HBO se tornasse uma Netflix). Além disso, os estúdios estão estimulando como podem o surgimento de operações concorrentes, e muitas estão dando certo. Na França, México e Reino Unido, para citar alguns mercados importantes, há grandes provedores locais de VOD. E não custa lembrar que Google e Apple também têm ofertas de conteúdos on-demand globais, e o Google começa a seguir o caminho da Netflix com o Youtube Red (ainda não disponível no Brasil), no modelo de assinatura. Dizer que a Netflix é a primeira empresa global de TV é um pouco impreciso. Talvez seja a primeira empresa de VOD global, mas CNN, ESPN e HBO adotaram estratégias de globalização há muito mais tempo e têm um alcance mundial há pelo menos duas décadas.

O outro fator de pressa da Netflix são os seus custos. A empresa tem enfrentado negociações cada vez mais duras com os detentores de conteúdo, o que aperta suas margens cada vez mais. A estratégia de investir pesado em produção própria (mais uma vez, seguindo o exemplo do que a HBO fez há mais de uma década) é não só uma tentativa de se diferenciar de outros serviços de VOD com ofertas muito parecidas mas, sobretudo, uma tentativa de melhorar as margens e a dependência dos grandes estúdios. O movimento de avanço a novos mercados mundiais ajudará a empresa a ter escala e acesso a novos mercados consumidores, mas também a ampliar seu leque de produtores de conteúdos parceiros e espaços para produções próprias, reduzindo a dependência dos estúdios de Hollywood.

Para o mercado de produção, a notícia é sem dúvida positiva. Trata-se de mais uma janela, um buyer de peso no mercado, com potencial para alavancar uma produção em escala global quase instantaneamente. Basta ver a velocidade com que Wagner Moura passou de artista reconhecido apenas no Brasil a celebridade mundial em poucas semanas. É uma oportunidade para a produção brasileira ganhar destaque em novos mercados (embora sujeita ao filtro da própria Netflix, que em última instância definirá o que entra ou não em seu acervo, e o que será recomendado a seus assinantes).

Mas esta expansão internacional não acontecerá sem dores, como quis dar a entender Reed Hastings na apresentação à imprensa. Ele disse, sempre sorrindo, que a adaptação às realidades locais será simples e gradual, dependendo apenas do aprendizado de cada região. Mas será complexo lidar com realidades tributárias e regulatórias de 190 países. É de se imaginar que muitos países não ficarão tão felizes em receber um player que cobra em dólares, no exterior, e não responde às autoridades locais. O Brasil, por exemplo, já começou a discutir uma regulamentação local para o VOD, e outros países estão no mesmo caminho.

A Netflix é, ao lado do Youtube, a empresa que mais mudou o mercado de TV nos últimos 10 anos. Do ponto de vista de definição de um produto de referência e de um modelo de negócio de sucesso, a Netflix é até mais relevante do que a plataforma de vídeos online do Google.

A empresa, no entanto, não está imune às investidas dos demais players do mercado de mídia, e seu problema maior não são as operadoras de TV por assinatura ou as emissoras de TV aberta.  A corrida é contra os grandes estúdios, que hoje produzem conteúdos audiovisuais de massa em quantidade e qualidade nunca antes vistas na história da televisão e que se deram conta de que, ao licenciarem seus conteúdos para a Netflix como fizeram, permitiram o surgimento de um player que ganhou dimensões além do imaginado. Reed Hastings consegue, hoje, com uma base de quase 70 milhões de usuários, dar as cartas em uma negociação por direitos. Os estúdios estão reagindo, esticando a corda e alimentando os concorrentes. Por tudo isso, a Netflix tem pressa.

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