A Comissão Especial que analisa o projeto de lei (PL) 2.338/2023, que cria um marco legal do uso de Inteligência Artificial no Brasil, realizou nesta terça-feira, 10, a sua primeira audiência pública sobre o PL. Neste primeiro debate, os participantes discutiram conceitos e modelos de regulação de IA.
Dario Durigan, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, destacou que o Brasil tem um histórico de regulação digital muito bem sucedido, citando como exemplos processo realizado durante a aprovação do Marco Civil da Internet (MCI) e da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). "Esses marcos legais se mostraram eficazes ao construir um ambiente mínimo saudável no mundo digital brasileiro", disse. Ele também informou que o governo vê como uma boa premissa o texto aprovado no Senado.
Na ocasião, Durigan explicou as intenções do Ministério da Fazenda no debate, e que passa diretamente pelos data centers. "A discussão que estamos fazendo sobre data center é isso: garantir um equilíbrio entre atração de investimentos, privilegiar acesso à capacidade de processamento para instituições de pesquisa brasileira, com abertura a inovação, tudo com segurança jurídica", apontou.
Já a relatora da comissão de juristas instituída pelo Senado Federal e que elaborou a proposta que deu origem ao PL 2.3382/2023, Laura Schertel, apontou que hoje, muitas empresas já adotam boas práticas para lidar com a IA, especialmente quando levam o recurso para dentro do seu cotidiano. "Não faz sentido para as empresas adotarem práticas antiéticas", argumentou ela.
Schertel também destacou que sobre regulação, somente o Congresso Nacional tem essa capacidade, e que é importante que neste processo exista uma estrutura de fiscalização da cadeia de responsabilidades e do ciclo de vida da IA. "Também é importante garantir que esses sistemas de IA sejam observados, pois assim se permite a sua governabilidade, além de se ter desses sistemas um mínimo de transparência", informou.
A especialista lembrou ainda que o texto aprovado no Senado traz uma proposta de regulação tipicamente brasileira, fundada em documentos e experiências internacionais, que foram adaptadas para a nossa realidade.
Para o representante da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), Cleber Zanchettin, é importante que o marco legal de IA no Brasil traga uma flexibilidade conceitual. "As definições devem ser amplas, mas baseadas em riscos. E precisamos usar a regulação como um estímulo para os nossos pesquisadores, para alavancar o Brasil", disse.
Ele também chamou a atenção para a responsabilização de governos, quando usam IA. " É importante garantir também a responsabilização de governos, contra determinados abusos. Como vamos fiscalizar as parcerias público-privadas?", questionou o representante da SBC.
Ele também defendeu a IA como instrumento de soberania nacional e uma política que evite o uso indiscriminado de dados de brasileiros por estrangeiros. Essa, na visão de Cleber Zanchettin, seria uma forma de soberania de dados.
IA para produtividade
O presidente da Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), Andriei Guitierrez, defendeu a importância do uso de IA para a produtividade, aspecto que ele avalia que é é pouco explorado nos debates.
"Nós não podemos esquecer um componente importante da IA: que é o crescimento de produtividade que ela proporciona. Ela é uma das tecnologias mais importantes do século 21", destacou.
Ele citou o caso do marco legal do Japão, que prevê um modelo regulatório que alia o uso da tecnologia com competividade. "Os países estão olhando para a IA como uma ferramenta de ganho de produtividade", reiterou.
Sobre direitos autorais, Guitierrez disse que era importante ter cautela nesse debate. "Qualquer regra forte de direitos autorais pode limitar soluções aqui no Brasil. Nossa sugestão é que este debate seja feito em outro momento, discutindo a lei de propriedade intelectual e temas correlatos de direitos autorais", defendeu.
Direitos para prosperidade
Bruno Bioni, Diretor da Data Privacy Brasil, acredita que a regulação brasileira deve garantir a prosperidade do País. Ele citou o que dizem alguns economistas vencedores do Prêmio Nobel, que defenderam em um livro que sem a previsão de direitos e deveres de determinadas tecnologias, não se alavanca a prosperidade nos países.
"Isso porque a previsão de direitos e deveres é fundamental. Uma boa regulação prevê isso. Dizer que isso evita inovação é um falso mito", explicou.
Bioni, que também integrou a comissão de juristas que elaborou a proposta que originou o PL 2.338/2023, disse ainda que o projeto não é um "copia e cola" da legislação europeia. "O sistema regulatório apresentado no 2.338 é bem diferente, por exemplo. Criamos um sistema diferenciado".
Sobre data centers, Bruno Bioni disse que a discussão brasileira não pode ser descolada do debate de regulação de IA. "É importante sincronizar a discussão sobre data center e IA. Isso precisa caminhar junto, porque essas tecnologias podem afetar o futuro do País", ressaltou.
O presidente da Brasscom, Affonso Nina, por sua vez, apontou que o modelo regulatório brasileiro deve ser leve e flexível e dinâmico, até porque no futuro o País pode estar discutindo o impacto de outras tecnologias.
"Esse debate deve se manter vivo. Precisamos ter um olhar para a inovação. Precisamos ter ações concretas que afirmem a inovação como uma política de Estado. Isso envolve a visão estratégica de Estado para o Brasil desenvolver suas tecnologias digitais", defendeu.
Nina chamou a atenção também para a classificação de riscos. Ele avalia que é importante aprofundar este conceito na legislação. "Sobre classificação de risco, importante aprofundar este conceito. Devemos olhar o risco e seus impactos. Isso deve ser feito junto, porque podemos ter alto risco com baixo impacto e baixo risco com alto impacto", ponderou.