Rede privativa traz risco de prejuízo de R$ 1,7 bi, diz área técnica do TCU

A análise da a rede privativa no relatório da área técnica do Tribunal de Contas da União sobre o edital do 5G é uma das mais extensas, mas que também aponta maior quantidade de ilegalidades na inclusão da proposta na minuta enviada pela Anatel. Segundo o levantamento, obtido por TELETIME, há risco de dano ao erário de até R$ 1,685 bilhão, sendo R$ 1 bilhão do valor originalmente previsto, e R$ 685,3 milhões de "valor adicional" previsto pela agência.

Mesmo após os questionamentos do Tribunal, tanto o Ministério das Comunicações quanto a Anatel não teriam apresentado argumentos capazes de retirar os indícios de ilegalidade apontados, segundo coloca o relatório. Além da própria inclusão, violando a Lei Geral de Telecomunicações, haveria ilegalidade às normas de licitação e orçamentárias, ausência de definição prévia e detalhamento (como obrigações, garantias e compromissos), indefinição de responsabilidade de operação, que seria da Telebras (segundo Decreto 9.612/2018) e falta de definição de instrumento jurídico para a transferência da rede privada à União. Por isso a recomendação para que se retire do edital do 5G esta obrigação

Há um entendimento de que a rede privativa não tem vínculo com o propósito do 5G e da universalização dos serviços de telecomunicações. Assim, não é considerada necessária na forma sugerida, e não deveria existir sem passar pelo devido processo de licitação. Até mesmo os exemplos internacionais trazidos pelo governo estariam em dissonância com a proposta apresentada. O projeto foi entregue sem especificações técnicas ou estrutura de governança definida, o que foi considerado uma "inversão da lógica usual de contratação de empresas privadas e dos órgãos públicos". 

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Sem licitação

Há questões de responsabilidade fiscal, além de falta de detalhamento. O parecer dos técnicos do TCU mostra que o MCom não contou com anteprojeto ou projeto básico para saber se o montante de R$ 1 bilhão previstos pela Portaria nº 12.924/2021 seriam suficientes. 

O projeto foi baseado em apresentação da Telebras, que por sua vez não teria aprovado por conselho de administração da estatal e nem do próprio Ministério. O documento coloca que a portaria estabelece o compromisso de implantação, "e não o mero pagamento de valores financeiros". No entendimento da área técnica do TCU, trata-se de obra de telecomunicações comum, ou seja, realizadas por operadoras para viabilizar a prestação de serviços – o que se caracteriza como atividade-meio da administração pública, passível de licitação e de execução por meio do orçamento público. 

Dessa forma, coloca que a rede privativa deveria ser contratada por meio de licitação, obtendo-se os mesmos requisitos de segurança previstos na Portaria. Também destaca que, embora a Telebras seja responsável pela operação, conforme o Decreto 9.612/2018, ela não participará do grupo de especificação e contratação da obra de construção da rede. Por isso também, afirma haver "indícios de incoerência" com essa operação por parte da estatal e o próprio processo de desestatização que o governo conferiu à empresa.

Segurança

O Ministério das Comunicações justificou o projeto ao Tribunal de Contas alegando que a estratégia de restrição a fabricantes seria a alternativa escolhida em vez de uma proibição mais geral em todas as redes comerciais do País, citando "restrições ao uso de equipamentos de um dos três principais fabricantes" – ou seja, a Huawei

Os técnicos do TCU rebatem, dizendo que, embora o MCom diga que a rede privativa seja essencial para a introdução do 5G no Brasil, o projeto não trata dessa tecnologia, mas de uma rede 4G no Distrito Federal e de banda larga fixa e dispositivos de criptografia "que funcionam em qualquer rede comercial e não exigem uma rede própria de telecomunicações". 

O relatório contradiz o Ministério, colocando que não há registro de contratação de redes privadas em outros países na forma de compromisso do edital de 5G, colocando que exemplos citados pelo MCom, como de rede privativa nos Estados Unidos, não são a mesma coisa que o projeto brasileiro. Os servidores do TCU procuraram o Departamento de Estado dos EUA, que afirmou que o governo norte-americano não opera redes privadas com equipamentos autônomos, e que as comunicações seguras utilizam a mesma infraestrutura de rede comercial e pública da Internet. 

Especificamente no caso da FirstNet, citado pelo governo brasileiro, embora tenha núcleo físico separado direcionado o tráfego, ela encaminha tráfego por hardware de rede comercial. A informação foi confirmada pela Federal Communications Commission (FCC), em resposta ao TCU.  Assim, o parecer da área técnica do Tribunal de Contas coloca que não há indícios de que a rede privativa garanta segurança maior do que o possível na rede comercial. 

Orçamento

O documento cita a Anatel ao colocar que há risco de o valor de R$ 1 bilhão previsto no edital não seja suficiente para todas as demandas da rede privativa. Um custo adicional seria a operação da rede em cinco anos, valorada em R$ 1,58 bilhão adicionais pelo projeto da Telebras. E esses gastos estariam violando o Teto de Gastos para o orçamento do próprio governo. Não há tampouco obrigações legais ou contratuais para que os órgãos que fossem utilizar essa infraestrutura possam opinar ou exigir qualquer aspecto relacionado. 

A ausência de definição de instrumento jurídico para a transferência da rede privativa à União também é apontada pelos técnicos do TCU como um risco ao erário. O Ministério das Comunicações colocou que haveria essa "doação" (na verdade uma obrigação às operadoras), mas não definiu como isso aconteceria, e por isso havia risco sobre a titularidade da rede e mesmo uma possível incursão de gastos por parte da União. "A ausência de prescrições sobre os termos e condições sob os quais ocorrerá a transferência da Rede Privativa, assim, constitui indício de violação a esse dispositivo, deixando lacunas quanto à titularidade desse objeto, de alta relevância e materialidade da ordem de bilhão de reais, trazendo insegurança jurídica e riscos de futuros litígios."

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