Em se tratando de 5G, o setor de satélites não está em sintonia com as operadoras móveis ou mesmo com propostas de entes públicos. Nas contribuições à consulta pública do MCTIC sobre a estratégia do governo para a quinta geração, a indústria satelital defende a manutenção do uso do espectro – sobretudo nas faixas de 28 GHz, 3,5 GHz e 1,5 GHz – e diz que o serviço tem, sim, importância para a expansão da rede móvel no País, sobretudo nas regiões remotas.
O Sindicato Nacional de Empresas de Telecomunicações por Satélite (Sindisat), em conjunto com a Associação Brasileira das Empresas de Telecomunicações por Satélite (Abrasat), rebate o posicionamento de fornecedores móveis e diz que o satélite "desempenhará um papel fundamental" no ecossistema 5G, afirmando que será "essencial" e "vital" para várias áreas como mobilidade, distribuição de vídeo e backhaul de celular, entre outras. Por isso, pede que a disponibilização de espectro para serviços terrestres preserve também o espaço para os serviços satelitais. A entidade lembra que a tecnologia no setor espacial também tem se desenvolvido, com os primeiros artefatos de 1 Tbps já aparecendo em 2020, além das constelações órbita não geoestacionária (com foco em redução de latência) e satélites híbridos operando nas bandas Ka e Q/V.
Para a entidade, é necessário preservar as faixas de frequência já atribuídas ao satélite, dentre elas a de 28 GHz (banda Ka, de 27,9 a 28,4 GHz), conforme resolução 676/2017 da Anatel, citando investimentos já realizados para artefatos HTS. Além disso, reitera a importância da banda C, Ku, Q/V e L (neste último caso, para serviços móveis via satélite – MSS). Há também uma requisição de faixas específicas para redes de transporte 5G via satélite. O Sindisat cita iniciativas dos EUA e Canadá, além de relatório da União Internacional de Telecomunicações (UIT), reconhecendo a importância esse tipo de infraestrutura para a nova tecnologia.
A associação global que reúne a indústria de comunicações via satélite, a Global VSAT Forum (GVF), ressalta ainda que a a UIT deverá incluir na recomendação ITU-R M.2083 o "interfuncionamento entre as várias tecnologias de acesso, o que poderia incluir uma combinação de várias redes fixas, terrestres e de satélites". Além disso, cita que a padronização do 5G no 3GPP inclui elementos de redes não terrestres (NTN) no Release 17, previsto para junho de 2021. Cita ainda que o relatório técnico do Release 14 já incluía o requisito da conectividade rural 5G.
Especificamente sobre a banda C e a banda Ka, a GVF reclama que disponibilizar as frequências (respectivamente 3,5 GHz e 28 GHz) para a rede móvel terrestre "seria muito difícil e oneroso" para as empresas satelitais mitigarem com mudança para outras bandas ou encontrar meios alternativos para a entrega de serviços. Ressalta que a indústria "conta com acesso contínuo à banda C em futuras implantações de satélites devido à demanda contínua por serviços de conectividade" e ao baixo custo de implantações. "Portanto, as políticas 5G do Brasil devem promover o investimento contínuo na implantação atual e futura de serviços de satélite", atesta a entidade. Em anexo, sugere "medidas especiais" para evitar a interferência na faixa de 3,5 GHz, como a implantação de filtros "passa-faixa" e uma faixa de guarda entre o serviço fixo via satélite (FSS) e as emissões de 5G, com tamanho variando de 20 MHz a 100 MHz.
A associação adiciona ainda a proposta de uso de satélite nas bandas Q/V (37,5 a 42,5 GHz; 47,2 a 50,2 GHz; e 50,4 a 52,4 GHz); na faixa de 40-42 GHz e 48,2-50,2 GHz; e, no futuro, na banda E (71-76 GHz e 81-86 GHz). Dessa forma, o Global VSAT Forum sugere para deixar para o 5G as faixas de 66-71 GHz, que contam com capacidade de até 5 GHz e teriam atualmente "pouco uso" e poderia trazer sinergias com o padrão WiGig, na faixa de 61 GHz.
Banda L
Por sua vez, a operadora de satélites Inmarsat destaca que uma proposta da Anatel (também adotada pelos fornecedores) de disponibilizar a faixa de 1,5 GHz para o serviço móvel "pode ameaçar a disponibilidade futura e a confiabilidade dos MSS (Serviços Móveis via Satélite) na banda L". Isso porque esse espectro é utilizado em aplicações críticas, incluindo comunicações de segurança obrigatórias para aviões e navios, comunicações de resposta a desastres, suporte a eleições e aplicações industriais de IoT. Segundo a empresa, estudos da UIT e da CEPT demonstram que a compatibilidade da banda larga móvel na faixa de 1.492-1.517 MHz representa "grave risco" para as operações MSS acima de 1.518 MHz "em razão da susceptibilidade dos terminais de MSS à interferência prejudicial".
Assim, a empresa pede que a estratégia 5G do MCTIC prossiga sem prejudicar os sistemas satelitais no Brasil. "A melhor forma de proteger as operações do MSS seria não autorizar novas operações móveis na faixa", declara a companhia. No caso de o governo prosseguir com a destinação, pede que seja especificado na nova regulamentação características técnicas para proteger o serviço satelital. Ou ainda deixar claro a necessidade de proteção em operações atuais e futuras em frequências acima de 1.518 MHz, incluindo entre 1.525-1.559 MHz. A contribuição da Inmarsat é endossada por parceiras da operadora, como a Intersatellite, a Globalsat, a Arycom e a MVS Brasil.
Minioperadoras
O Sindisat entende que a estratégia 5G deve promover a viabilização de mini e micro-operadoras, com política de espectro em nível regional e municipal, o que considera que "será crucial" para que a tecnologia seja disponibilizada para além dos grandes centros urbanos. "A existência de mini e micro-operadores permitirá uma maior cobertura de atendimento a áreas remotas e rurais com baixa densidade populacional, e combinada com uma política de compartilhamento de espectro ou da rede de acesso também facilitará a presença dos operadores nacionais nessas áreas de difícil cobertura." Como candidatos prováveis, cita os provedores regionais (ISPs).
Na visão do sindicato, além da implantação de fibra para a infraestrutura do 5G, deve-se priorizar também iniciativas semelhantes de redes de transporte via satélite. A associação menciona como possíveis exemplos os satélites HTS para penetrar mais rapidamente em áreas rurais e remotas, ou de média e baixa órbita (MEO e LEO) com "características nos mesmos patamares" da fibra. Justifica ainda que isso viabilizaria parcerias entre novos mini e micro-operadores com as operadoras satelitais. A entidade diz que, mesmo em grandes centros urbanos, essas operações menores poderiam explorar, por exemplo, shoppings e estádios de futebol com 5G em ondas milimétricas.
Regulamentação
A proposta do Sindisat é de que seja construído uma nova modalidade de outorga e licenciamento de acordo com a aplicação final, e não ao meio utilizado; ou por serem móveis ou não. Afirma que, assim, o ambiente progredirá, com serviços combinando redes satelitais e de celular, por exemplo. "Esse mesmo conceito se aplica também para o provimento de infraestrutura, que cada vez mais, por diversas razões, necessita ser compartilhada."
Desta vez engrossando o caldo das operadoras móveis, o Sindisat fala na desoneração das conexões M2M. Mas também pede que isso seja aplicado aos equipamentos VSATs, que poderiam ser utilizados para implantação da última milha. Além disso, cita que o Fistel aplicado a essas estações funciona como uma "verdadeira barreira competitiva". A ideia é equiparar aos de telefones celulares, com o valor de R$ 26,83 para VSATs de pequeno porte e antena de diâmetro inferior a 2,4m.
Cita também aplicações da rede satelital para conectividades rurais e em Internet das Coisas. "O ponto a destacar é que, quando se pensa em IoT, a cobertura geográfica passa de um papel coadjuvante para um papel de protagonista e a tecnologia satelital exercerá um papel fundamental." Assim, o sindicato quer que políticas públicas estabeleçam isonomia na cobrança de tributos e taxas para os serviços de satélite, inclusive para escolas.