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Governo publica criação da ANDP com vetos ao texto do Congresso

(Atualizado às 22:45) Foi publicado hoje, 9, no Diário Oficial da União o Projeto de Lei de Conversão – PLV que altera a lei 13.709 de 2018, criando a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, com vetos ao texto. O PLV é fruto do relatório da Medida Provisória 869/2018, analisada na comissão mista criada no legislativo, presidida pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO) e tendo como relator o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). O texto publicado hoje no DOU trouxe vetos sobre a decisão automatizada; as sanções, aplicadas aos agentes de tratamento de dados, no caso das infrações cometidas; o perfil do encarregado; taxas como fonte de recursos para a ANPD e o compartilhamento dos dados pessoais de requerentes de acesso à informação com empresas privadas. O legislativo ainda pode derrubar os vetos.

O governo vetou, por exemplo, a revisão por pessoa natural de classificações geradas de maneira automatizada, quando solicitada pelo titular dos dados . A revisão por pessoa natural visava impedir que uso de algoritmos e inteligência artificial gerassem falhas interpretativas, trazendo danos ao detentor dos dados.

Ficaram vetados os dispositivos que previam, em caso de infração, a suspensão e até proibição do uso de banco de dados e do exercício das atividades que envolvem o tratamento de dados pessoais.

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Um debate importante que aconteceu durante a análise da MP 869/2018 pela comissão mista foi o perfil do encarregado em sancionar eventuais falhas na manipulação dos dados. O texto original exigia uma série de atribuições, colocando este ator como um elemento importante na aplicação da lei. O governo vetou a necessidade deste encarregado ter conhecimento jurídico-regulatório e a previsão de que a ANPD regulamentará os casos em que poderá ser indicado um único encarregado por grupo de empresas. A GPDR, lei europeia de proteção de dados, prevê um agente com função semelhante, exigindo desse ente uma expertise no assunto a ser regulado.

Originalmente, a Medida Provisória que criava a ANPD previa uma série de receitas para a autoridade, tais como as dotações, consignadas no orçamento geral da União; doações; valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis e imóveis de sua propriedade, dentre outros. Um deles era a cobrança de taxas pelos serviços prestados pela autoridade. Este item foi vetado no texto que saiu hoje.

Foi vetada ainda a proibição de compartilhamento dos dados pessoais de requerentes de acesso à informação com empresas privadas.

Críticas

Sobre este ponto, Laura Tresca, diretora-executiva da organização Artigo 19 no Brasil, diz que o problema não era com as empresas privadas, mas sim com entes da gestão pública. “A ideia era de que o funcionário público que responder ao pedido de informação não tivesse acesso aos dados de quem está requerendo as informações. Não se trata de um processo de anonimização, porque o preenchimento dos dados é obrigatório, mas sim de preservar a pessoa que solicita informações, isso porque vemos acontecer na administração pública federal, quando uma mesma pessoa realiza vários pedidos, uma certa má vontade do agente público em responder. Algo como ‘lá vem aquela mesma pessoa pedir informação’. E isso ser motivo para negar o pedido.” Laura completa dizendo que em casos mais extremos, existem ameaças à pessoa que pede informações a execução orçamentária de um município. “As pessoas sofrem retaliações por fazerem pedidos de informações públicas”, explica a jornalista.

A diretora-executiva da Artigo 19 diz ainda que durante o processo de debate da construção da LGPD, esse ponto nunca foi polêmico. “Mais uma vez, observa-se que os governos Temer e Bolsonaro nunca estiveram atentos ao debate da construção. Esse ponto nunca foi uma questão polêmica. E eles voltam a cercear uma previsão que seria extremamente benéfica à toda a sociedade, sem perceber que isso nunca foi um ponto polêmico.”

Bruna Santos, analista de advocacy e políticas públicas da organização Coding Rights, enxerga problema no veto que retira a obrigatoriedade de revisão, das decisões automatizadas, por pessoa natural. “Um dos vetos ao Projeto de Lei de Conversão foi ao parágrafo 3º do artigo 20, reintroduzido ao texto da Lei por meio de emendas oferecidas a MP 869. A obrigatoriedade de revisão de decisões automatizadas por pessoa natural havia sido vetada pelo Presidente Michel Temer quando da sanção da Lei 13.709/2018 e reinserida após o oferecimento de 12 emendas na Comissão mista da MP 869/2018. A medida é importante para oferecer ao titular dos dados o direito de revisão do processamento de dados que tenha tido como resultado algum tipo de discriminação, bem como conferir mais transparência e accountability as decisões algorítimicas. Nessa mesma linha, a regulamentação europeia de proteção de dados pessoais reconhece o risco que decisões automatizadas podem oferecer para os direitos e liberdades fundamentais dos titulares dos dados.”

Danilo Doneda, advogado, professor do IDP e especialista em proteção de dados, avalia que no geral, os vetos não estão embasados em posicionamentos anteriores do Congresso. “Alguns desses pontos já estavam no projeto de lei originalmente aprovado, foram mudados pela MP 869/2018, depois foram retomados pelo Congresso e foram novamente vetados. Então acho que tem uma tensão bastante concreta entre os posicionamentos do Congresso e do governo, levando em conta que essas mudanças ocorreram em dois governo diferentes, o que editou a MP e esse que agora tá vetando.” Doneda destaca como exemplo o veto à revisão de decisão automatizada por pessoa natural. O advogado diz que em uma última análise, o veto parece insignificante sob certo ponto de vista, porque qualquer revisão desse tipo só será uma revisão se feita por pessoa natural. “Se uma máquina revisar a decisão de uma máquina teremos situações absurdas. Se uma máquina revisar a decisão de uma máquina, você vai entrar em um loop infinito, na qual você nunca vai ter uma solução jurídica satisfatória. Sendo a única saída uma pessoa tomar a decisão. E no fundo é isso que é necessário. O problema de uma decisão por máquina é a falta de clareza, de critérios. A ideia da revisão por pessoal natural é a única forma de você colocar o elemento de humanidade nessa situação.” E completa que em tirando essa revisão por pessoa natural, a lei brasileira segue um caminho contrário à tendência do que vem se discutindo no mundo sobre o uso de máquinas nesse casos.

A Autoridade Nacional de Proteção de Dadosestá mantida, com sua autonomia técnica e decisória, mas vinculada à Presidênciada República. A natureza jurídica da ANPD é transitória e poderá sertransformada pelo Poder Executivo em entidade da administração pública federalindireta, submetida a regime autárquico especial e vinculada à Presidência da Repúblicaem até dois anos.

A LGPD envolveu, durante a sua tramitação, diferentes grupos de interesse e seu texto final foi fruto de um considerável grau de entendimento, incluindo uma nota pública assinada por diversos setores empresariais e organizações da sociedade civil. Já durante a avaliação da MP 869 na Comissão mista, houve divergências entre esses grupos. Os vetos podem ser derrubados pelo Legislativo.

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