Entidades da sociedade civil apresentam ação contra União e Anatel questionando decreto do novo modelo

Foto: Pixabay

Sete entidades da sociedade civil apresentaram nesta quinta-feira, 6, com uma Ação Civil Pública (ACP), com pedido de liminar, contra a União e Anatel. As entidades contestam na Justiça as determinações do Decreto 10.402/2020 com relação à renovação das autorizações hoje em vigor para o uso de radiofrequências, que poderão passar a ser delegadas por prazo indeterminado para as operadoras. O Decreto regulamenta a Lei 13.879/2019, que instaura o novo modelo de telecomunicações, permitindo o processo de migração de concessões para autorizações. A assinatura do texto foi feita na posse do novo ministro das Comunicações, Fábio Faria.

Na ACP, as organizações Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Instituto Bem-Estar Brasil (IBEBrasil), Coletivo Digital, Garoa Hacker Clube, Associação Internacional de Comunicação Compartilhada (Compas) e Clube de Engenharia também refutam a metodologia de cálculo do valor dos bens reversíveis do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) realizada pela Anatel a partir da Consulta Pública n° 5.

O pedido de liminar da Ação Civil Pública é para suspender os dispositivos do Decreto 10.402, tendo em vista os riscos de danos graves e de difícil reparação ao erário e ao interesse públicos. "O objetivo da Ação Civil Publica é que a União Federal e a Anatel calculem os bens reversíveis com base nas determinações do Tribunal de Contas da União (TCU) e de da Justiça Federal, para que se considere tudo o que foi ou não foi vendido desde o início da concessão em 1998 até agora", explica a advogada Flávia Lefèvre do Intervozes, especialista em telecomunicações.

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Renovação de espectro

As entidades afirmam que o decreto 10.402/20, ao prever a possibilidade de prorrogação e a transferência de autorização de frequências (mercado secundário), de outorgas de serviços de telecomunicações, traz uma "grave ameaça à soberania nacional". Segundo Lefèvre, a medida é ilegal porque contraria os princípios da licitação e de interesse da administração pública, uma vez que o Estado estaria entregando um recurso público de alto interesse (espectro), finito, para a iniciativa privada sem o poder regulatório previsto.

"Esse decreto não é lei, é um ato administrativo e como tal deve cumprir os princípios da legalidade. O decreto tem de cumprir os princípios que estão na Constituição. Por todas essas razões, a gente, organizações da sociedade civil, entende que esse decreto é ilegal", conclui a advogada.

Metodologia

"De acordo as regras de migração dos contratos de concessão para autorizações, vai se apurar o valor da concessão, incluindo o valor dos bens reversíveis, e o que for apurado será utilizado para se firmar compromissos das empresas para se fazer novos investimentos em redes de banda larga. Ou seja, se a gente subavaliar esses bens como Anatel está fazendo, vamos ter menos investimentos na nova infraestrutura de redes para atender a demanda do brasileiro por banda larga", sintetiza, Lefèvre.

A advogada aponta ainda que nesse método de cálculo, quanto menos valor for atribuído aos bens reversíveis, mais o Estado vai ter que se virar para garantir investimentos em redes de banda larga. "Ou não tendo dinheiro para tal, a sociedade ficará sem acesso, sem infraestrutura, sem a democratização da infraestrutura de banda larga. Significa a manutenção desse fosso digital imenso que é a desigualdade de acesso à internet no Brasil, tão clara agora nesse cenário de pandemia", complementa a advogada.

Decisão do TCU

Na ação, as entidades lembram que o Tribunal de Contas da União já atestou que há mais de 20 anos a Anatel, além de ter deixado de fazer o acompanhamento do equilíbrio econômico das concessões, também não fez qualquer controle do acervo de bens vinculados às concessões constituído por centenas de imóveis, redes de dutos, redes de telecomunicações, redes de acesso, redes de transporte, backhaul, antenas e equipamentos instalados em todo o território nacional.

De acordo com o critério patrimonial de avaliação determinado pelo TCU e pela Justiça Federal, o valor desses bens reversíveis é estimado em R$ 121 bilhões. O então MCTIC e a Anatel, no entanto, consideravam apenas o valor de hoje, que estaria na casa de R$ 17 bilhões, apontam as entidades na ACP.

O Acórdão 2.124/2019 do Tribunal de Contas da União, que trata da questão dos bens reversíveis citada pelas entidades na ação foi alvo de duras criticas do conselheiro da Anatel, Aníbal Diniz, quando estava prestes a terminar seu mandato no colegiado máximo da agência. "Não posso me calar diante de uma decisão que coloca em xeque essa casa e nossas atribuições", disse o conselheiro. Diniz disse que a decisão do TCU é "inaplicável".

Na época, Aníbal reconheceu que a agência errou ao não ter se posicionado antes sobre um entendimento mais claro e definitivo em relação aos bens reversíveis. "Deveríamos ter definido. Diante de tal espaço, e assumo essa culpa como integrante da agência, o TCU considerou por bem ocupá-lo, mas deveria ter observado as atribuições da agência". Atualmente, contudo, a Anatel entende que a polêmica sobre os bens reversíveis já está encerrada. Mais recentemente, o superintendente de competição, Abraão Balbino, destacou que o decreto e a Lei 13.879 não alteraram o conceito de bens reversíveis.

Confira a íntegra da ação aqui.

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