A proposta do conselheiro Vicente Aquino, que relata o processo que discute o enquadramento dos serviços de distribuição de canais lineares pela Internet é de um enquadramento como Serviço de Valor Adicionado (SVA), ou seja, uma atividade não sujeita à regulamentação da Anatel. Segundo Aquino, não seria possível o enquadramento como serviço de telecomunicações porque os serviços de Internet não estão vinculados a uma rede de distribuição, enquadrando-se como aplicações de Internet nos termos do Marco Civil da Internet e com a Lei Geral de Telecomunicações, além da portaria 1.153/2020 (que cria a Rede Conectada) do antigo MCTIC. "É a medida mais adequada em relação aos custos e benefícios, possibilitando novos modelos de negócio disruptivos e inovadores".
Pelo entendimento do conselheiro, contudo, esse enquadramento não se dá sem consequência. E por esta razão em seu voto ele traz uma série de recomendações em relação à regulação do SeAC. A matéria, entretanto, ainda não foi decidida, pois o conselheiro Emmanoel Campelo pediu vistas. Ainda assim, o conselheiro Moisés Moreira consignou o voto acompanhando o do relator. "A Anatel está perdendo o timing e o protagonismo", disse em sua consideração.
Vicente Aquino reconhece que existe uma assimetria regulatória entre o serviço de TV por assinatura tradicional (SeAC) e os serviços pela Internet (que a Anatel chama de TVLAI, ou Transporte de Vídeo Linear na Internet), especialmente nas obrigações de distribuição de conteúdos audiovisuais independentes. Mas não apenas nesta questão: há muitas regras impostas às prestadoras de SeAC que não estariam previstas em lei.
Por isso determina, em seu voto, que a área técnica da agência (superintendências de competição e de planejamento e regulamentação) avalie em 30 dias os dispositivos regulatórios que não contam em lei e que possam ser eliminados para os operadores tradicionais. Na mesma linha, pede que se apresente uma proposta de alteração da agenda regulatória para o biênio 2021-2022, especialmente em relação ao enquadramento de Mercado Relevante, levando em consideração o peso concorrencial dos prestadores de serviço pela Internet. Aquino determina ainda que a área técnica avalie medidas de acompanhamento em conjunto com a Ancine.
Regras de comunicação social ficam fora
Vicente Aquino chegou a cogitar, segundo minutas a que este noticiário teve acesso, uma proposta de encaminhamento, por meio do Ministério das Comunicações, de contribuição ao Congresso Nacional para que indicasse a necessidade de uma regulamentação do Artigo 222, especialmente em relação ao parágrafo 3, para enquadrar a distribuição de canais lineares pela Internet, "uma vez que esta se caracteriza como tipo de comunicação social eletrônica e, como tal, deve observar os princípios do artigo 221, em especial no que diz respeito à promoção da cultura nacional e regional, e estímulo à produção independente". Entretanto, na versão final esta proposta não chegou a ser incluída.
Mas ficou a sugestão para que a Anatel recomende ao Congresso uma revisão da Lei 12.485/2011 (Lei do SeAC) para que ela seja compatibilizada com os novos modelos de negócio pela Internet.
Vistas
O pedido de vistas decorre, segundo apurou este noticiário, decorre da complexidade da matéria, e porque o voto só foi apresentado às vésperas da reunião da Anatel, fora do prazo regimental, e ainda assim alterado diversas vezes um pouco antes da reunião, de modo que não teria sido possível a análise adequada das implicações. Campelo deve discutir com os demais conselheiros as implicações e a possibilidade de aprovação da matéria na próxima reunião, que acontece dia 27 de agosto.
O voto de Aquino não considerou, contudo, a petição de entidades do setor de produção independente, divulgado nesta quinta-feira, 6, e que pedia a retirada de pauta do caso. O conselheiro Emmanoel Campelo afirmou não ter conhecimento do documento, e o presidente da agência e do conselho, Leonardo Euler, declarou que há prazo para o encaminhamento de petições em tempo hábil antes da reunião do conselho. (Colaborou Bruno do Amaral)
A lei 12.485 enquadra os canais lineares como SeAC, independente da tecnologia. Ah, mas ela está defasada, como faz? Simples, ao invés de mudar a lei, criamos um puxadinho chamado TVLAI. Essa é a história da regulação das comunicações no Brasil. De puxadinho em puxadinho, criamos um monstrengo sem nenhum vestígio de política pública.