Anunciada nesta quarta-feira, 3, durante o Pay-TV Forum 2022, a iniciativa conjunta da Anatel e Ancine em busca da possibilidade de realizar bloqueio administrativo de streamings piratas foi bem recebida pelo setor. Mas o que ficou claro é que o combate contra a distribuição de conteúdo ilegal é constante, mas tem rendido frutos. Ou seja, já está longe de ser apenas "enxugar gelo".
No lado da Anatel, os esforços envidados até agora estavam concentrados na apreensão de produtos não homologados – as caixinhas de IPTV (na realidade, de streaming pirata, diferente do serviço de TV por assinatura por fibra e que não utiliza a Internet aberta). Em parceria com marketplaces, como Amazon e Shopee, e com órgãos como a Receita Federal, a agência totalizou 1,2 milhão de caixinhas apreendidas.
Conselheiro da Anatel, Moisés Moreira observa entretanto que o volume está diminuindo – no Rio de Janeiro, o total de produtos caiu de 380 mil no ano passado para 15 mil até o momento em 2022. Para ele, isso demonstra que as ações estão surtindo efeito, ainda que também pode haver diversificação de locais de distribuição, como outros portos.
Para a diretora de relações estratégicas da Alliance for Creativity and Entertainment (ACE) para a América Latina, Ana Sousa, apesar de ser o maior em volume de pirataria, o Brasil é um dos países mais avançados no combate à prática. A entidade, que é um braço operativo da associação de cinema norte-americana (MPA), atua na Operação 404, que busca impedir sites de distribuição de conteúdos piratas. Ela cita dados de 2019: "Retiramos 10 mil links em sites de busca. Fizemos análise [posterior], e dos 1.400 serviços ilegais, ficaram 240."
Por isso, Sousa diz que as notícias são boas. "Traz resultado. Não acho que é enxugar gelo. Mas tem que ser guerrilha, contínuo", avalia.
A expressão foi trazida pelo gerente de segurança de conteúdo da Globo, André Felipe Teixeira. Ao citar o trabalho de remoção de conteúdos da emissora em redes sociais, ele diz que a automação permite evoluir de forma menos custosa e mais eficaz. "Muitas vezes isso é chamado de enxuga gelo. Mas isso é pejorativo, é um trabalho de limpeza, de saneamento. É como tirar pó de casa, tem que ser todo dia."
O efeito é sentido. O coordenador antipirataria da Ancine, Eduardo Carneiro, lembra que as ordens judiciais para retirada de sites já podem sem feitas de forma dinâmica, permitindo estender bloqueio de IPs ou domínios diferentes sem precisar voltar ao judiciário. "Hoje chegamos a uma redução de 85% no acesso daqueles sites, temos uma efetividade de bloqueio maior", diz, citando a Operação 404.
Caminhos
O diretor de estratégia regulatória da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), Jonas Antunes, afirmou estar "felizmente surpreendido" com o termo de cooperação técnica entre Anatel e Ancine para bloqueio administrativo, avaliando que é um sinal de se estar no caminho correto. Ele argumentou que "tirar a pirataria audiovisual da prateleira" era crucial, buscando formas de restringir a disponibilidade. "A experiência internacional demonstra que arranjos entre autoridades são comuns. Quando vejo Anatel e Ancine, com participação da indústria, oferecerem caminho institucional para a gente oficializar bloqueios com ordem administrativa, temos condições de minimamente lidar com o problema na origem."
Questão considerada de emergência por Antunes, a revisão regulatória também seria outro passo para fortalecer o combate da indústria. O diretor da ABTA diz que seria ideal ter na legislação, de forma clara e expressa, a possibilidade de intervenção nos casos de ilegalidade. O CEO da LTA Hub e sócio do escritório CQS/FV Advogados, Ygor Valério, complementa que é necessário também a participação de empresas de plataformas digitais, até para atuar com agilidade no impedimento de streamings piratas.
A discussão ocorreu durante o primeiro dia do Pay-TV Forum 2022, evento organizado por TELA VIVA e TELETIME em São Paulo e que continua na quinta-feira, 4.