Para os ministros do TCU que se manifestaram durante o julgamento do processo de pactuação por consenso entre Oi e a Anatel na migração do regime de concessão para autorização, o caso traz muitas situações excepcionais que não permitem que ele seja tomado por referência para outros acordos. Por outro lado, a pactuação se mostrou a solução possível para o imbroglio dos bens reversíveis, um impasse jurídico que opõe o TCU e a Anatel há décadas e que apenas com a migração consensuada parece ter encontrado uma solução definitiva.
Para Walton Rodrigues, ministro decano do TCU, "a solução (no caso da Oi) está longe de ser paradigma para outros processos". Segundo ele, as eventuais falhas técnicas que possam ter sido relevadas no processo de pactuação "deram lugar ao interesse público" de assegurar a continuidade dos serviços de uma empresa "que tem prestado relevantes serviços à sociedade por décadas".
Já o ministro Benjamin Zymler lembrou que o caso trouxe à análise do interesse público também a "ótica consequencialista" e que finalmente as divergências sobre bens reversíveis se pacificam. "Já fomos muito duros em nossas manifestações sobre isso, e há múltiplos critérios para classificar os bens", disse ele. Para ele, o problema dos bens reversíveis é um conflito insuperável e que geraria uma discussão infindável se não fosse a possibilidade de um acordo.
Os bens reversíveis são, segundo a legislação, aqueles bens necessários à continuidade dos serviços de telefonia fixa em regime público. Tipicamente, trata-se da rede de acesso, centrais de comutação e imóveis necessários ao serviço. Na hipótese de fim da concessão, cabe à União prestar o serviço ou voltar a concedê-lo, e nesse caso os bens reversíveis devem ser revertidos para a União. O problema é que, ao longo do tempo, nem TCU nem a Anatel chegaram a posições definitivas sobre como fazer o controle e acompanhamento desses bens, muito menos sobre como eles retornariam à União. Apenas recentemente, com a Lei 13.879/2019, a visão funcionalista do tratamento dos bens reversíveis ganhou mais peso, mas ainda assim boa parte dos debates no TCU se deram em cima do valor do patrimônio das redes, ainda decorrente de uma leitura patrimonialista que vigorou por muitos anos.
Conta incerta
Segundo Zymler, mesmo os valores ponderados no processo de pactuação estão envoltos em incertezas. Segundo ele, a Anatel apresentou uma conta de migração de R$ 20 bilhões, mas a Oi estimou em R$ 12,97 bilhões os bens ainda não amortizados, e que deveriam ser objeto de indenização. Mais R$ 2,47 bilhões que seria o custo de manutenção dos serviços. "Diante disso, o custo de migração seria de R$ 4,28 bilhões, de modo que os R$ 5,8 bilhões parecem razoáveis como valor econômico do acordo. Mas esses valores todos têm sempre muitas incertezas", disse.
Zymler ponderou que o que se esperava é que a Oi abrisse mão da arbitragem, mas essa seria a "tábua de salvação" para a V.tal fazer os investimentos que a concessionária não teria condições de fazer. "Estamos diante de uma situação inusitada", reconheceu Zymler. Segundo ele, diante do ineditismo no caso, nem mesmo é possível ter segurança sobre as probabilidades de vitória do governo em arbitragens.
Para o ministro do TCU, contudo, a iminente falência da Oi se o acordo não fosse alcançado poderia levar a uma desestruturação do mercado de telecomunicações na oferta de telefonia fixa. Ele reconhece que o acordo "é uma solução inventiva, para uma situação para a qual não estamos acostumados no direito administrativo tradicional".
Ainda segundo ele, a aprovação do acordo precisou se dar diante dessa visão pragmática e consequencial, e recomendou que o TCU acompanhe agora o desdobramento da arbitragem e da pactuação com a AGU.