A National Telecommunications and Information Administration (NTIA) do governo dos Estados Unidos entende que qualquer pagamento direto dos provedores de aplicações às operadoras de telecomunicações poderia reforçar a posição dominante de mercado das maiores operadoras.
A entidade enviou manifestação à tomada de subsídio da Anatel sobre direitos e deveres de grandes usuários de serviços de redes. O processo avalia a possibilidade de uma cobrança pelo uso intensivo das redes – ou o chamado fair share.
O órgão norte-americano, vinculado ao Departamento de Comércio dos EUA, entende que tal medida poderia também dar às grandes operadoras uma possibilidade de influenciar a dinâmica de tráfego de dados de determinados clientes, aumentando os custos para os usuários finais e alterando os incentivos para que os fornecedores de conteúdos e aplicações tomem decisões eficientes relativamente ao investimento na rede e à interligação.
O NTIA também chama a atenção para o fato de que é difícil ver como tal sistema de pagamento poderia ser aplicado sem minar o princípio da neutralidade da rede que consta no Marco Civil da Internet.
Cenário positivo para operadoras
O NTIA aponta alguns dados que mostram que o mercado brasileiro está positivo para as operadoras de telecomunicações, como os da União Internacional de Telecomunicações (UIT). Entre eles, o número de consumidores brasileiros com assinatura ativa de banda larga móvel ter aumentado de 184 milhões em 2019 para 200 milhões em 2022.
"O número de indivíduos que usam a Internet no Brasil também cresceu de 73,9% em 2019 para 80,5% em 2022, uma tendência que pode beneficiar as operadoras de telecomunicações. As plataformas digitais, por sua vez, ajudam a estimular uma maior procura pelas ofertas dos operadores. Assim, o aumento da procura destes serviços dá aos fornecedores de serviços de telecomunicações oportunidades para expandir a sua base de clientes e aumentar as receitas para apoiar o aumento do investimento em infraestruturas de telecomunicações", diz o NTIA. A maior parte das empresas geradoras de tráfego, vale lembrar, é norte-americana.
Outro aspecto destacado pelo órgão norte-americano é o investimento em infraestrutura que as empresas de aplicações fazem para otimizar seus serviços aos usuários finais, tais como sistemas submarinos de cabos de fibra óptica, centros de dados, pontos de troca de Internet e locais de cache.
"Esses investimentos reduzem os custos de transporte internacional para as operadoras de rede, apoiam a eficiência da rede e melhoram a experiência do usuário para os consumidores brasileiros", afirma o NTIA.
Experiências internacionais
Como exemplos de que o pagamento de taxas pelas bigt techs às operadoras não produz os efeitos esperados, o NTIA cita o caso da Coreia do Sul. O NTIA cita pesquisas de 2022 e 2023 da Internet Society (Isoc), que indicariam que as taxas de rede de pagamento direto na República da Coreia contribuíram para a redução de investimentos e maiores custos para os usuários.
Também cita as preocupações do Organismo de Reguladores Europeus das Comunicações Electrónicas (BEREC), apontando que as taxas de pagamento direto, conhecidas como fair share, forneceriam aos provedores de serviços de telecomunicações a capacidade de explorar o monopólio da terminação e que uma mudança tão significativa poderia ocasionar danos significativos ao ecossistema da Internet.
Fundos setoriais
Outro destaque na contribuição da Administração Nacional de Telecomunicações e Informações do governo dos Estados Unidos (NTIA) é a experiência dos EUA com as políticas desenvolvidas a partir do Fundo de Serviço Universal, que é financiado por taxas de utilização de serviços de telecomunicações, para alcançar objetivos de ampliação de infraestrutura de telecomunicações.
"A abordagem dos Estados Unidos para financiar melhorias na infraestrutura de banda larga envolve investimentos privados, um Fundo Nacional de Serviço Universal e financiamento público proveniente de dotações gerais. Mecanismos de financiamento publicamente responsáveis podem garantir melhor que os recursos sejam dedicados aos principais objetivos políticos, como a melhoria do acesso e o reforço da segurança das redes. Ao mesmo tempo, é importante evitar medidas discriminatórias que distorçam a concorrência", diz o NTIA.
O fundo é abastecido com recursos dos provedores de serviços de telecomunicações interestaduais e de alguns outros provedores de telecomunicações, como os provedores de VoIP interconectados. O NTIA explica que eles contribuem com uma porcentagem de suas receitas de usuário final para esses serviços em um fundo para apoiar a implantação de rede e complementar os serviços aprovados e a implantação e manutenção de equipamentos. Neste sentido, foram traçados paralelos entre a política pública e o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) brasileiro.