A indústria de satélites, que antes vivia em uma posição de conforto, precisou se adaptar às rápidas mudanças tecnológicas e às demandas do mercado. Segundo o assessor especial da SES, Ruy Pinto, os últimos anos trouxeram transformações expressivas e a era de estabilidade no setor chegou ao fim.
"Francamente, no final da década de 90 e começo da década passada, a indústria de satélites estava muito confortável. Havia um bom fluxo de caixa e as empresas estavam lucrando. Mas essa situação nunca seria sustentável", disse o executivo da SES nesta quarta-feira, 2, durante o Congresso Latinoamericano Satélites.
Segundo ele, a pressão pela redução de custos e a necessidade de inovação foram fatores determinantes para essa mudança. "Os clientes passaram a exigir melhorias, já que no setor terrestre as tecnologias estavam evoluindo rapidamente, com fibra óptica, 4G, 5G, e agora 6G", lembrou.
Outro fator responsável pelas transformações descritas por Pinto foi a mudança no mercado de distribuição de TV, após o boom dos serviços de streaming – iniciado em 2010 com a popularização de plataformas como Netflix, por exemplo. "Isso mudou o que era o mais responsável pelo fluxo de caixa [das empresas de satélite], o ganha-pão de todo mundo", afirmou.
Transformações
Mas essa pressão sobre o setor também impulsionou a transformação na indústria de satélites. Segundo Ruy Pinto, houve avanço de inovações tecnológicas, como a fabricação de satélites menores e mais baratos e o desenvolvimento de foguetes reutilizáveis.
O assessor especial da SES também mencionou que a reutilização de foguetes, como o Falcon 9 da SpaceX, foi um avanço importante, mas não o único responsável pela mudança no setor. "O que você vê hoje em dia é a redução no custo de fabricação de satélites, a exploração de órbitas diferentes e a criação de novos modelos de negócios", comentou.
O contexto geopolítico global e as mudanças nas políticas governamentais, que continuam a influenciar o setor, também são pontos que exercem pressão para que a cadeia se movimente. De acordo com o representante da SES, a saúde das companhias satelitais passa por dois eixos: consolidação e o eixo de inovação. "Tem que fazer essas duas coisas e fazer melhor do que se fazia antes", apontou.
Futuro
Para Pinto, o futuro da indústria de satélites dependerá da capacidade de inovação e adaptação das empresas.
Isso porque o executivo acredita que, embora os novos modelos de negócios ainda estejam em fase de consolidação, o setor continuará passando por transformação nos próximos anos com a chegada de novos serviços.
Nesse sentido, uma das principais promessas para alavancar a receita das operadoras satelitais é o direct-to-device (D2D). Essa tecnologia permite que smartphones e outros dispositivos com conexão celular (smartwatches, tablets ou equipamentos para IoT, por exemplo), se conectem diretamente às redes de satélites.
"Isso vai ser uma nova onda transformadora da indústria. Mas vai demorar mais e vai custar mais dinheiro", diz Ruy Pinto. Ele afirmou que a maturação para esse tipo de serviço tem a ver com a necessidade do desenvolvimento tecnológico, necessidades claras do cliente e um mercado que suporte isso – financeiramente falando.
O D2D já está sendo testado em várias partes do mundo, incluindo o Brasil – onde a Anatel autorizou testes para uso temporário de radiofrequências.
Soberania
Outra discussão relevante apontada por Ruy Pinto é a relação entre o desenvolvimento da indústria de satélites com a necessidade da busca por soberania espacial dos países. De acordo com ele, esse mercado é promissor – apesar do setor ainda não ter uma visão clara sobre o real tamanho dele.
A Europa, preocupada com o domínio da Starlink no mercado de Internet via satélite, deseja encorajar o desenvolvimento de uma indústria. Nessa mesma linha, a China também corre para ter a própria rede no espaço – e até já lançou os primeiros modelos de órbita baixa de constelações para concorrer com a operadora de Elon Musk.
"Primeiro tem o ângulo da soberania. E segundo tem o ângulo de dependência. Sou um grande fã da SpaceX, mas países e empresas não gostam de monopólio. Ninguém gosta", contou Ruy Pinto, ao citar exemplos de empresas que correm para lançar satélites.