Embora a Anatel tenha demonstrado interesse em atuar de alguma forma na regulação das over-the-top (OTTs), a agência ainda é limitada pela Lei Geral de Telecomunicações. Desta forma, para representantes da radiodifusão – Globo e SBT – durante o Feninfra Live realizado nesta sexta, 2, o debate precisa de uma "conversa dura" para atacar a questão na esfera legislativa, ampliando o alcance da agência ou tratando diretamente de garantir respeito às leis brasileiras por parte de plataformas globais.
O diretor de relações institucionais da Globo, Marcelo Bechara, interpreta que o enquadramento (das plataformas) apenas pela LGT colocaria no mesmo patamar um usuário final e uma grande empresa de tecnologia como clientes de serviço de valor adicionado (SVA). Além disso, entende haver um desafio regulatório atual com a "concentração transversal, que passa por baixo do radar de todas as autoridades antitruste", com empresas de tecnologia atuando em diferentes segmentos.
"O que unifica são os dados, o crescimento dos dados. Esse grande usuário de SVA precisa ter um olhar diferenciado, porque passa a ter um poder de mercado digital significativo", declara o ex-conselheiro da Anatel. Bechara compara o grupo de mídia Globo, com "responsabilidade editorial e sede no Brasil", com outras empresas que estariam utilizando o conteúdo da emissora e rentabilizando em cima disso. "Quando vê o balanço financeiro [do grupo inteiro], não sabemos quanto faturam no Brasil, é um mistério. E quando se olha globalmente, é mais de 80%, talvez 90%, com publicidade", afirma.
Bechara defende a aprovação do PL 2.630/2020, o PL das Fake News, por ter, além da remuneração de conteúdo jornalístico, a determinação de que a publicidade voltada ao mercado nacional precisa respeitar as leis brasileiras. "Parece meio óbvio, mas, além de ter aspecto do ponto de vista regulatório e respeito, tem o aspecto fiscal", explica. "Muitas das atividades publicitárias são feitas fora do Brasil, mas são direcionadas ao mercado brasileiro. Mas essas receitas não são contabilizadas aqui, e consequentemente a tributação não incide." O executivo chama a prática de "elisão fiscal", mas reconhece que pode ser considerada uma evasão também. Empresas de tecnologia já se manifestaram contra o projeto de lei.
Do ponto de vista do SBT, a regulação precisa acontecer para oferecer uma "competição justa", indo além do primeiro olhar sobre a inovação trazida pelas novas plataformas. "No momento em que se transforma em um monstro, um leviatã, é preciso olhar, ver o poder de mercado significativo, a dimensão das infraestruturas, o quanto se aproximam de um monopólio", declara o diretor de relações institucionais e regulatórias da emissora, Roberto Franco. "Não é só desregulamentar ou só regular, é um equilíbrio."
Para Franco, é necessário buscar mudanças mais profundas, ainda que legislativas, como no caso da LGT e mesmo da Lei do SeAC. "Precisamos partir para algo mais pragmático. Não adiante ter soluções simples, precisa ter conversas duras e partir para a ação."