SDE quer restrições na comercialização de direitos esportivos

A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE) publicou nesta sexta, 2, sua nota técnica em relação ao processo administrativo que corre desde 1997 e que averigua a existência de práticas anti-competitivas na comercialização de direitos esportivos no Brasil. A nota é bastante impactante porque recomenda ao Cade que, ao analisar e julgar o caso, proíba cláusulas de exclusividade, venda conjunta e direito de preferência na aquisição de direitos esportivos no Brasil.
A íntegra da nota técnica está disponível em www.paytv.com.br/arquivos/nota_SDE.pdf .
O principal objeto da nota técnica é a relação comercial existente entre o grupo Globo e o Clube dos Treze na negociação dos direitos sobre o Campeonato Brasileiro, ainda que as condutas dos grupos Bandeirantes e da TVA tenha sido avaliadas em relação à aquisição dos direitos no final dos anos 90. Contra estes dois últimos grupos, não foi constatada, conforme a nota técnica, nenhuma prática anticompetitiva.

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Em relação às condutas de Globo e Clube dos Treze, entretanto, a nota técnica faz recomendações ao Cade, que deverá julgar o processo administrativo.

* Um dos pontos analisados pela SDE é a comercialização conjunta dos direitos de transmissão praticada pelo Clube dos Treze. Na prática, o que acontece é que o Clube dos Treze, que representa alguns clubes do país, é quem organiza o processo de venda, ainda que os contratos precisem depois ser celebrados individualmente, clube a clube. A SDE considerou que, como no Brasil não há direito de arena (em que um clube tem todos os direitos sobre os jogos realizados em seu campo), essa prática de comercialização conjunta é justificável.

* A SDE também entendeu que o fato de o Clube dos Treze não incluir outros clubes não configura prática anticompetitiva, já que na prática outros clubes acabaram aderindo às negociações conduzidas pelo grupo.

* Outro ponto analisado foi o fato de duas emissoras fazerem propostas conjuntas. Foi o caso específico de Globo e Bandeirantes, referente aos direitos de 1999. A SDE entende que essa prática também não poderia ser considerada abusiva já que foi uma associação de curto prazo destinada a atender às exigências do processo de seleção do Clube dos Treze.

* A SDE avaliou ainda a condição de venda combinada dos direitos esportivos referentes ao Campeonato Brasileiro em 1999 pelo Clube dos Treze. Naquela ocasião, por sugestão da Globo, segundo o relatório da secretaria, os direitos referentes à TV aberta, TV paga e pay-per-view foram comercializados em um pacote único, ou seja, o comprador em uma mídia tinha que comprar para todas as outras. No entendimento da SDE, esta prática foi extremamente lesiva à concorrência. A SDE elogia a conduta atual do Clube dos Treze de fazer a negociação separada para cada uma das mídias. Sobre o argumento colocado pela Globo de que a comercialização conjunta ajudaria a fortalecer o negócio de futebol como um todo, a SDE diz que "a detenção dos direitos de transmissão na televisão aberta não é uma condição necessária para desenvolvimento do produto futebol na televisão fechada e pay-per-view. Para assegurar o desenvolvimento do produto futebol na televisão fechada e pay-per-view, o que é importante é a existência da cláusula que limita o número de transmissões ao vivo das partidas na televisão aberta e mesmo a celebração de um contrato de maior duração para garantir a amortização do investimento. Isto é: existiam meios menos restritivos à concorrência para garantir o desenvolvimento do produto futebol na televisão fechada do que a venda em um só pacote de todos os direitos".

* Outro ponto bastante polêmico em relação aos critérios de comercialização de direitos esportivos no Brasil avaliado pela SDE é a questão do direito de preferência, em que a atual detentora dos direitos (no caso, grupo Globo) sempre tem a chance de conhecer as propostas concorrentes e, se conseguir cobri-las, manter a preferência na aquisição. O argumento que a Globo colocou, segundo a SDE, é o de que este é um mecanismo necessário para a amortização dos investimentos feitos. A secretaria, contudo, entende que esse mecanismo é abusivo. "O direito de preferência na renovação é prejudicial não somente para a venda dos direitos de transmissão na televisão aberta, mas também nas outras mídias, como televisão fechada, Internet e telefonia móvel. Em Internet e telefonia móvel, outros grupos de mídia poderiam competir pelos direitos de transmissão, desenvolvendo o produto futebol em outros formatos, em benefício da concorrência e dos consumidores", diz a SDE, que lembra ainda "a existência de outros meios menos restritivos à concorrência como a contratação por um prazo maior" para assegurar estes mesmos investimentos. A SDE recomenda ao Cade proibir as cláusulas de direito de preferência.

* Outro ponto analisado pela SDE: a exclusividade sobre os direitos esportivos. A secretaria reconhece, em seu relatório, que não necessariamente a exclusividade cria efeitos anticompetitivos, mas constata que no caso brasileiro, essa prática tem limitado a concorrência na TV aberta e, na TV por assinatura, tem inibido o surgimento de canais concorrentes. "Na televisão fechada, a exclusividade de venda dos direitos de transmissão também limita a concorrência, na medida em que dificulta a criação de um outro canal esportivo para concorrer com o Sportv (…).Esse problema foi diminuído com o Termo de Compromisso de Cessação firmado pelo CADE com Globo e Globosat, determinando a venda do canal Sportv para qualquer operadora de televisão por assinatura interessada, de forma não discriminatória, dentre outras obrigações. No entanto, essa determinação não resolve totalmente o problema, na medida em que cria condições para a existência de apenas um canal esportivo de peso na televisão fechada, conferindo vantagens monopolísticas à Globosat sobre todas as operadoras interessadas em adquirir o Sportv", diz a nota técnica da SDE. Nesse ponto, a SDE conclui pela infração à ordem econômica por parte do Clube dos Treze.

* A SDE analisou também os contratos de sublicenciamento, em que a detentora exclusiva dos direitos cede conteúdo a outras emissoras. A constatação da SDE é que quando esses contratos de sublicenciamento incluem cláusulas restritivas, em que a detentora dos direitos determina que conteúdos a concorrente vai exibir, o modelo tende a não funcionar e, portanto, não se diminui os efeitos negativos da exclusividade.

* Avaliando a participação da Globo no processo de definição das condições de negociação dos direitos praticadas pelo Clube dos Treze, a SDE avaliou que existiram práticas anticoncorrenciais. "As informações constantes nos autos mostram uma efetiva participação da Globo no formato de venda, com o exercício de sua posição dominante para direcionar os contratos aos seus interesses em detrimento da concorrência, especialmente em relação à venda em um só pacote dos direitos de transmissão nas temporadas de 1997 a 1999 e à continuidade nos contratos do direito de preferência na renovação. Assim, entende-se que a Globo deve também ser condenada por prática de infração à ordem econômica", sugere a SDE ao Cade em sua nota técnica.

* Sobre a forma de comercialização dos direitos, de modo a permitir o desenvolvimento dos mercados de TV paga e pay-per-view, trazendo mais receitas aos clubes, e ao mesmo tempo propiciar a concorrência no mercado de TV aberta, a SDE sugere ao Cade que imponha o seguinte modelo: "que seja quebrada a exclusividade na venda dos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro de Futebol na televisão aberta, com a comercialização de 03 (três) pacotes: (i) um pacote, contendo o direito de transmissão ao vivo das partidas das quartas-feiras e domingos, no máximo de 01 jogo por praça em cada rodada; (ii) um segundo pacote, contendo o direito de transmissão ao vivo das partidas de quintas-feiras e domingos, no máximo de 01 jogo por praça em cada rodada 57; e (iii) um terceiro pacote, contendo o direito de transmissão dos melhores momentos das partidas já realizadas".

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