Sá Leitão diz que proposta para VoD só sai se houver consenso setorial; Condecine sobre faturamento está descartada

Sérgio Sá Leitão, ministro da Cultura

Esta semana, na reunião doConselho Superior de Cinema, o ministério da Cultura apresentou uma proposta de diretrizes para resolver a questão da Condecine sobre o serviços de vídeo-sob-demanda. Houve questionamentos no mercado, sobretudo entre produtores e distribuidores de conteúdos nacionais, que avaliaram a proposta como um desestímulo ao surgimento de grandes acervos de conteúdo, já que a cobrança seria feita pelo volume de títulos, e não sobre o faturamento. Sérgio Sá Leitão, ministro da Cultura, explica nesta entrevista que esta foi uma proposta costurada a partir de contribuições recebidas dos diferentes players, mas reconhece que ainda há problemas para serem resolvido. E ele garante: só haverá uma proposta ao Congresso quando houver um significativo consenso sobre a forma de agir. Acompanhe a íntegra da entrevista:

TELETIMEQual a expectativa do Ministério da Cultura em termos de prazos para resolver a questão da Condecine sobre vídeo-sob-demanda?

Sérgio Sá Leitão – A questão da regulamentação da Condecine sobre o VoD é uma demanda do setor audiovisual. Desde o início tenho dito, e reitero aqui, que do ponto de vista do governo estamos condenados ao consenso. Ou seja, a ideia do governo é apenas encaminhar algo relacionado a este assunto quando for obtido um consenso entre os players do mercado e depois, naturalmente, entre as diversas áreas que compõem o governo. O timing para isso será o da construção do consenso.

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E existe alguma possibilidade de chegar a este consenso este ano?

Sigo bem otimista, até porque já evoluímos bastante, amadurecemos bastante com todos os players e os entes governamentais. Acredito que estejamos caminhando nessa direção. Mas de fato é uma questão bastante complexa e um mercado novo, em que há vários modelos de operação e negócio distintos, tudo isso ainda em processo de consolidação e, por isso, é necessário cuidado para não dar nenhum passo em falso. De um lado precisamos resolver o problema, porque a presente situação, com ausência de regulamentação específica, cria uma insegurança jurídica e é um fator de inibição para o desenvolvimento do mercado, para a entrada de novos players e de mais opções ao consumidor. Mas por outro lado é necessário ir com calma porque se trata de algo complexo. Uma decisão equivocada ou precipitada pode ser prejudicial. Mas estou otimista sobre a possibilidade de um consenso. A convergência está próxima.

Mas parece haver muitas divergências ainda.

O que passamos até aqui foram etapas necessárias. Minha visão é que é melhor perder tempo agora para chegar a este entendimento do que partir para uma definição unilateral do governo e esse debate, na tramitação do Congresso, levar meia década, como aconteceu na Lei do SeAC. Cada dia que dedicamos agora são meses economizados na tramitação futura.

Você diz que a proposta apresentada ao conselho não é uma posição do MinC, mas um documento coletivo. Qual foi a participação da Ancine e dos players neste documento?

Desde de que nós começamos a travar mais objetivamente este debate no Conselho Superior de Cinema, a partir de agosto de 2017, a posição do Ministério da Cultura foi a de não ter uma posição. Ou seja, de se colocar como um ente mediador e de buscar induzir ou estimular a construção do consenso. Por isso é que criamos primeiro um grupo de trabalho, que ouviu todos os players, a própria Ancine e o que ela havia discutido internamente, e apresentou uma proposta de matriz para a discussão. Isso foi debatido no pleno do Conselho Superior de Cinema onde outras divergências apareceram. Decidimos dar mais tempo e solicitamos aos players que não concordavam com a proposta do GT que apresentassem as suas propostas. Foram várias propostas, e os técnicos da Ancine e do MinC se debruçaram sobre o material para buscar ali um caminho intermediário. O que foi apresentado e debatido na reunião desta semana foi justamente este documento, que não constitui uma proposta do MinC, mas um documento base feito a partir de várias propostas apresentadas e que tem o objetivo de construir uma síntese. Foram levantadas dúvidas e questionamentos, as reuniões e encontros vão continuar, e na próxima reunião do Conselho, mascada para o início de abril, queremos apresentar uma proposta consensuada entre todos. É um processo natural de debate, discussão e entendimento, já que estamos levando em consideração as posições de todos os players. Já evoluimos bastante em relação ao que havia no início.

A proposta desta semana traz uma inovação, que é a Condecine Catálogo. A crítica é que isso pode estimular pequenos catálogos em detrimento do long-tail, de acervos maiores. Como você vê essa crítica?

É uma crítica pertinente. A questão é complexa e precisamos levar muitos fatores em consideração. Este modelo resultante de várias propostas apresentadas nas últimas reuniões e tem vários méritos e pontos positivos, mas apresenta esta questão: não necessariamente há uma relação entre o peso econômico e a capacidade contributiva de uma empresa e o número de títulos da plataforma que ela opera. É possível haver uma empresa pequena, com poucos assinantes e faturamento pequeno, mas que tenha um muitos títulos licenciados. E pode haver uma plataforma premium, de uma empresa forte, com conteúdos exclusivos, que sejam poucos, mas com grande receita porque cobra caro pela exclusividade. São dois modelos possíveis e de fato esta modalidade, conforme foi desenhada, trataria de forma inadequada. É o que eu digo: o panorama é bastante complexo, é preciso chegar a uma fórmula simples, exequível e justa do ponto de vista tributário, e que seja um fator de promoção e desenvolvimento do mercado, e não de inibição. As críticas que foram feitas e os reparos me parecem pertinentes e temos que trabalhar para chegar ao modelo ideal.

Mas o caminho de criar uma nova Condecine sobre catálogos é a tendência ou a tributação sobre faturamento das empresas de VoD ainda está na mesa?

A tributação sobre faturamento, conforme foi proposto anteriormente, me parece inteiramente descartada porque muitos players não concordam com essa posição e se manifestaram frontalmente contrários. Como o nosso objetivo é a construção de consenso, vamos discutir aquilo que não for questão de princípio. Mas vejo que a incidência da Condecine sobre o faturamento, conforme havia sido proposto, está fora de questão e já foi descartado por quase todos os conselheiros, que compreenderam isso e partiram para outros modelos. Não necessariamente será a proposta feita (esta semana), porque consideramos outras possibilidades. Vamos evoluir isso em fevereiro e março para chegar ao início de abril com algo amadurecido, mais claro e mais propício ao consenso.

Sobre os mecanismos de renúncia da Condecine em favor de investimentos na produção nacional, isso está combinado com a área econômica do governo?

É um debate que está também em andamento e temos dialogado com as demais áreas do governo. Mas é importante dizer que isso foi aprovado como diretriz em uma resolução do próprio Conselho Superior de Cinema, levada a debate e aprovada por unanimidade em agosto, quando ali estabelecemos claramente o "framework" da discussão. Ali aprovamos por unanimidade, tanto dos conselheiros da sociedade civil quanto do governo, uma resolução dizendo que enfrentaríamos a questão da regulamentação da incidência de Condecine sobre VoD com a possibilidade de criação de estímulos ao licenciamento e à coprodução de conteúdo brasileiro, e que deixaríamos o debate sobre o marco regulatório mais abrangente para depois, para deixar o mercado amadurecer, regulando ex-post. Ficou claro que teríamos estímulo ao conteúdo brasileiro via benefícios para licenciamento e coprodução, e isso está no horizonte. A questão é a fórmula que seja simples o bastante para ser exequível, maleável o bastante para dar conta da complexidade do mercado e assegure uma receita expressiva para o Fundo Setorial do Audiovisual e o Tesouro, que compense ao longo do tempo a diminuição da arrecadação da Condecine sobre a TV paga. Estamos trabalhando com essa dimensão, olhando dados do mercado de VoD e projetando a arrecadação e o estímulo. Aumenta a arrecadação com a Condecine sobre o VoD que compensará a queda no mercado de TV paga. Me parece muito mais inteligente trabalhar a proeminência do conteúdo brasileiro desta forma do que o estabelecimento de cotas, algo já descartado pelo CSC em agosto.

O Congresso tem hoje dois projetos de lei que tratam do marco legal de VoD. O governo têm uma posição sobre eles?

Iniciamos a análise dos projetos. Um foi apresentado no segundo semestre de 2017 na Câmara e outro apresentado esta semana no Senado. Já temos uma análise mais aprofundada do primeiro projeto. O outro é muito parecido mas vamos olhar com mais calma, pois há a necessidade de um posicionamento. É um movimento legítimo de parlamentares de apresentarem propostas, mas que são unilaterais, não levaram em consideração diversas outras propostas já feitas. Os dois projetos têm um viés determinado que não representa a visão de boa parte do setor audiovisual brasileiro. Assim que concluirmos a nossa análise teremos um posicionamento, mas acredito que a proposta que tenderá a ser uma referência daqui para frente será a do Conselho Superio de Cinema, pela representatividade e por ser necessariamente de consenso, se não de todos, pelo menos da imensa maioria dos players do setor.

Será por Projeto de Lei ou Medida Provisória?

Não há nenhuma restrição técnica a nenhuma das possibilidades. Será uma análise que o governo ainda vai fazer e será discutido com os presidentes da Câmara e Senado para ver a melhor maneira de encaminhar esta questão. Também aqui é necessário um consenso entre governo e Congresso para que a tramitação seja mais rápida e objetiva. Nosso compromisso é com o debate, com a pluralidade e construção do consenso, para que a proposta ganhe em solidez e legitimidade.

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