O conteúdo móvel na era pós-Jobs

Na maioria dos obituários e homenagens póstumas publicados nesta quinta-feira, 6, em razão da morte de Steve Jobs, fundador da Apple, o destaque principal foi a revolução conduzida pelo executivo na indústria de eletro-eletrônicos, especialmente na última década, com produtos como o iPod, o iPhone e o iPad. Pouco se falou, contudo, de outra revolução que acompanhou o sucesso desses mesmos produtos: as mudanças no modelo de negócios de venda de conteúdo móvel.

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Dez anos atrás, quando se começou a falar em "serviços de valor adicionado" (SVAs) em telefonia celular, que nada mais são do que conteúdos digitais como ringtones, notícias em SMS, games etc., eram as operadoras que controlavam esse mercado. As vendas eram feitas majoritariamente por dentro de portais WAP das teles do mundo inteiro. Eram elas que escolhiam o que podia ou não entrar em seus catálogos. E abocanhavam a maior parte da receita, chegando a 80% em alguns casos. Por muitos anos, o universo do conteúdo móvel tinha como sol a figura da operadora, ao redor do qual orbitavam integradores, agregadores de conteúdo e desenvolvedores. As equipes de SVAs das teles eram pequenas e nunca deram conta de analisar com calma todos os projetos de parceria que lhes eram propostos. Ao mesmo tempo, não havia interesse em flexibilizar a divisão da receita, a não ser nas raras ocasiões em que se tratava de parceria com algum mega provedor de conteúdo de massa. O pequeno desenvolvedor era sempre o último a ser ouvido e o que levava o menor percentual no faturamento. Nesse contexto, havia pouco espaço para inovação.

A exceção vinha do Oriente. A operadora japonesa NTT DoCoMo abriu seu portal de SVA para a livre publicação de conteúdos por parte de quaisquer desenvolvedores e acenou com uma divisão de receita bem diferente: o produtor do conteúdo ficava com 90% do faturamento. O serviço, conhecido como i-mode, foi um sucesso retumbante, fomentando o crescimento da comunidade de desenvolvedores e do consumo de SVAs, cuja participação na receita das operadoras móveis japonesas alcançou os maiores patamares do mundo, perto de 50%.

Pouco se fala sobre isso, mas é bem provável que a Apple tenha se inspirado no i-mode quando criou sua App Store. Trata-se de uma loja aberta, em que qualquer desenvolvedor pode publicar seus aplicativos (que passam, contudo, por um exame prévio, mas relativamente rápido, se comparado com os processos internos das teles) e que reparte com o criador do título 70% da receita. E a principal inovação: é uma loja internacional. Apps criados por pequenos desenvolvedores passaram a ter alcance mundial, sem a necessidade de se sentar à mesa com dezenas de operadoras. Aliás, no modelo de negócios da App Store, as teles foram reduzidas a meras transportadoras de bits e bytes. A partir daí o jogo mudou. Vieram o Android Market e dezenas de outras lojas de aplicativos abertas. E as operadoras se viram obrigadas e reavaliar suas estratégias nesse negócio.

Coincidentemente com o falecimento de Steve Jobs, o mercado de conteúdo móvel está entrando em uma nova fase. O modelo da App Store começa a receber críticas por parte de alguns grandes provedores de conteúdo, especialmente empresas de mídias, que não concordam em entregar para a Apple 30% da receita obtida com vendas feitas por dentro dos aplicativos. E a saída parece ser o uso do padrão HTML5, que permite a instalação de apps que rodam através de navegadores em diversos sistemas operacionais móveis, sem a necessidade de download via App Store.

Ao que tudo indica, a era pós-Jobs em conteúdo móvel será de ainda mais liberdade para desenvolvedores e grupos de mídia. Mas isso não significa o ocaso das lojas de aplicativos. Elas continuarão atraindo produtores interessados em sua rede de distribuição e facilidade de faturamento internacionais. Talvez haja, claro, algumas adequações. E nunca se sabe o que a Apple pode inventar de novo, agora com Tim Cook.

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