Para governo, estatal de banda larga terá papel regulador do mercado

Principal responsável pela condução do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), o assessor especial da Presidência da República, Cezar Alvarez, defendeu um papel mais ativo do Estado na oferta de Internet em alta velocidade, atuando como um "regulador de mercado" no equilíbrio dos preços dos produtos ofertados pelas empresas privadas. "Esse modelo será um instrumento regulatório no atacado e, eventualmente, no varejo", afirmou Alvarez durante o seminário Políticas de (Tele)comunicações, realizado pela revista TELETIMe e pelo CECOM/UnB nesta quinta, 4, em Brasília.
Três eixos compõem a proposta em gestação no governo, segundo o assessor especial da Presidência. O primeiro caminho, mais tradicional, envolve políticas de financiamento do serviço e de desoneração tributária, focando não só na prestação, mas também em uma política industrial para o setor. O governo estuda, inclusive, a possibilidade de subsídios diretos à população, caso seja necessário, e também a volta do subsídio cruzado como forma de baratear os serviços de acesso à Internet. Outro caminho, classificado pelo assessor como "menos comum", é o da separação estrutural entre as redes de telecomunicações e as prestadoras de serviço, onde o maior exemplo no mundo é o modelo usado pela British Telecom. Por fim, há o eixo que visa a gestão das redes de fibra ótica criadas a partir dos investimentos feitos pelas estatais do setor energético, como Eletrobrás e Petrobras. "Elas têm um belíssimo backbone", afirmou Alvarez sobre a rede elétrica que atinge mais de 4 mil municípios. "E é esse o ponto que temos que discutir: como isso (a rede das elétricas) será comercializado."
Segundo o responsável pelo PNBL, o caminho que o governo seguirá é um "misto" dessas três alternativas. O alvo da política de banda larga é atingir as classes C e D, que hoje estão fora do acesso à Internet em alta velocidade. O principal motivo desse hiato digital ainda seria o preço, segundo Alvarez. E, pelas análises feitas pelo governo, há uma diferença perceptível de preço quando há baixa concorrência na região. Se há dois competidores, o preço cai para 70% do valor cobrado em uma área onde há monopólio na oferta de banda larga. Com um terceiro competidor, os valores médios caem para 50%. "É preciso que o nosso jovem brasileiro não precise depender do lugar onde nasceu para ter acesso ao desenvolvimento tecnológico", afirmou Alvarez.

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Sem fazer concorrência
Alvarez diz que a intenção do governo não é fazer concorrência com as teles, mas apenas usar uma estrutura pública para equilibrar a oferta de serviço, focando especialmente em áreas onde as empresas não chegam. "O fato é que existem 934 municípios em que ninguém chega. Nós não teremos e nem queremos obter lucro. Mas eu também não posso ser ineficiente, incapaz nem, quiçá, burro. Nós vamos fazer uma boa banda larga também nos centros urbanos, vamos levar às favelas dos grandes centros onde ninguém chega", afirmou Alvarez. "Eu não assino embaixo de que não vou (oferecer banda larga) onde o Valente não vai. Nós temos ativos que vamos jogar na mesa", provocou o assessor, referindo-se ao presidente da Telefônica, Antônio Carlos Valente, que também compunha a mesa de debates.
O responsável pelo PNBL disse ainda que o plano não visa duplicar redes já existentes e refutou as críticas de que seria um desperdício de dinheiro público o Estado investir na banda larga. "Temos 31 mil km em infraestrutura e será um desperdício de dinheiro público se não usarmos", afirmou o assessor. "Se privatizou as telecomunicações, mas o conceito de responsabilidade (sobre a oferta de telecomunicações) continua sendo do Estado. Não estamos falando de um modelo de responsabilidade das empresas privadas e irresponsabilidade o Estado", comentou mais à frente. "Eu tenho o dever público, como Estado social, de levar o serviço aonde ele não chega."
Diálogo
Cezar Alvarez aproveitou o debate com as teles para assegurar que o projeto do governo será implementado levando em consideração o diálogo com todos os segmentos. "Um dos objetivos é impulsionar e estruturar um grande sistema de banda larga sob bases colaborativas", afirmou. Esse grande sistema inclui várias frentes de atuação que vão além da criação de uma infraestrutura pública de oferta de banda larga, atingindo também a política industrial, estímulo ao uso de aplicativos, políticas educacionais, entre outros.
Um fato importante é que o governo pretende abrir uma mesa permanente de discussão sobre a implementação do plano com os diversos setores interessados no projeto. Essa mesa, no entanto, só deve ser composta após a divulgação do decreto presidencial com os parâmetros para a instituição do PNBL. "O governo não abrirá a mesa com zero de pensamento, sem diretrizes, sem estratégias", afirmou. "O governo chega à mesa com parâmetros, idéias e diretrizes. Ele não chega perguntando: 'E ai? Tudo bem?", disse.
Timing
Alvarez, nesse caso, respondia a uma provocação do pesquisador e coordenador do Centro de Estudos de Políticas de Comunicação, professor Murilo Ramos, da Universidade de Brasília. "Haverá margem para negociação desse decreto ou ele será publicado e depois é que as conversas começam?", provocou Murilo Ramos, para quem outro risco do projeto é ele estar sendo colocado em um ano eleitoral, o que limita as possibilidades de debate, sobretudo com o Congresso. "O governo acerta em colocar a discussão sobre a banda larga, mas talvez o timing não seja o ideal". Para Cezar Alvarez, de fato o ideal teria sido colocar essa discussão há três anos, mas como só agora isso foi possível, assim terá que ser feito.
Telebrás
Apesar das informações que circularam nesta semana de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já teria confirmado a escolha da Telebrás como gestora das redes do PNBL, Alvarez optou pela discrição sobre esse assunto. O assessor disse apenas que o projeto não vai recriar uma "Telebrás com 27 subsidiárias de operação", descartando somente a retomada da existência da estatal tal qual funcionava até 1997, quando o setor foi privatizado.
Ele explicou que o governo trabalhou em um levantamento das opções de gestão da rede pública e, em princípio, pareceu mais conveniente usar uma empresa que já exista ao invés de criar uma nova. "Alguém tem que gerir isso tudo. Quem vai gerir? Viu-se o que já existia, morto ou não, gostando ou não. O que acontece é que há uma certa má-vontade e até má-fé nessa discussão. Porque não se vai constituir um novo papel para a Telebrás", argumentou. Segundo Alvarez, a decisão sobre a empresa gestora também ainda precisa ser tomada pelo presidente Lula.
Instabilidade
Os debates foram realizados no 9º Seminário de Políticas de (Tele)Comunicações, realizado pela TELETIME e pelo Centro de Estudos de Políticas de Comunicação da UnB. Em diversos momentos, participantes se manifestaram da platéia em relação ao risco de instabilidade regulatória que estaria sendo criado com a nova formulação. O secretário de telecomunicações do Ministério das Comunicações, Roberto Pinto Martins, buscou responder a essa apreensão latente entre os participantes da seguinte forma: "Para a solução dessa questão (da banda larga), não acredito que veremos um filme do passado em que o governo transformará a estabilidade regulatória em uma montanha russa".

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