Pesquisadores apontam caminhos para conciliar gestão de tráfego, acordos comerciais e redes neutras

Entre os acadêmicos e representantes da indústria de telecomunicações, a neutralidade de rede é uma questão que pode ser polêmica, mas tem uma solução até simples: a resolução com supervisão de impacto econômico. Esse parece ter sido o teor durante boa parte das discussões no ITS 2014, que aconteceu nesta semana e que reuniu atendentes no Rio de Janeiro para discutir a Internet e a rede em si, como infraestrutura. Na visão de um dos principais pensadores sobre o tema, o professor da Universidade da Pensilvânia, Dr. Christopher Yoo, contratos como o da operadora norte-americana Comcast com a provedora de vídeos over-the-top (OTT) Netflix são legítimos. "Meu instinto é que eles deveriam dividir os custos, já que ambos se beneficiam no acordo", declarou.

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A posição de Yoo fica ainda mais clara quando, em outro painel, ele falou sobre a proposta do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que defende a reclassificação da banda larga como Title II, isto é, como serviço de telecomunicações e common carrier. Yoo alega que é uma manobra populista do presidente, e que isso causou desconforto na agência reguladora, a Federal Communications Comission (FCC). "Tom Wheeler (chairman da FCC), nos bastidores, está muito mais a favor de uma neutralidade híbrida", diz, referindo-se à tentativa de apresentar uma regulação diferente no acesso e no atacado.

"O problema não é mais banda, mas fazer algo que faça sentido para escoar o tráfego. É um problema mutuamente causado por ambas, muitas pessoas estão tentando usar isso para afetar negociação", declara Yoo. O entendimento é que a precificação da troca de tráfego e a topologia da arquitetura de rede são escolhas relacionadas, inclusive por parte das OTTs. "A Netflix poderia minimizar os custos, e de um ponto de vista regulatório, há rotas otimizadas. Controlar o tráfego não é premissa apenas dos provedores." Ele reitera que a abordagem caso a caso seria melhor, já que a Comcast não tem problemas com outros OTTs, como Amazon ou eBay.

Christopher Yoo acredita que práticas como a oferta de acesso gratuito em acordos entre operadoras e OTTs, como fazem as teles nacionais com redes sociais, é, sobretudo, um caminho para a universalização no mundo. "É mais importante pensar em como pegar os 4 bilhões que estão offline, do total de 7 bilhões (de pessoas no mundo), do que a qualidade da conexão, isso é segundo na consideração", declara. "O problema é que é um ponto tradicionalmente (de discussão) da neutralidade de rede."

Visão no Brasil

Para o CEO da TIM, Rodrigo Abreu, "as OTTs pareciam viver em um mundo paralelo", sem competição direta com o setor de telecom, mas agora há uma mudança de cenário. "Os messengers viram que as barreiras deixaram de aparecer. Se o SMS deixará de aparecer, é porque há penetração cada vez maior dos OTTs do topo da pirâmide, descendo para a cadeia de serviços de telecom", destaca.

O discurso de Abreu não é gratuito: a operadora acabou de lançar no Brasil uma modalidade de plano pré-paga no qual o acesso a dados é o principal, oferecendo o uso gratuito do serviço WhatsApp. "Acreditamos que essas parcerias vão ser cada vez mais necessárias, e daí a discussão para que esse ecossistema funcione bem", diz. "A TIM tem feito esforço para o uso das plataformas, até para a migração de valor de dados e a relação com os OTTs."

Essa questão deverá ser abordada na regulamentação da neutralidade no Marco Civil. A presidenta Dilma Rousseff deverá receber o aconselhamento técnico do Comitê Gestor de Internet (CGI.br) e da Anatel, que já sinaliza que a oferta de acesso gratuito em serviços móveis é um modelo de negócios legítimo.

Soluções

O professor do departamento de ciências da Universidade da África do Sul, Petrus H. Potgieter, acredita que já existe uma solução para promover o tratamento igualitário de pacotes: o acesso a redes virtuais privadas. "A VPN pode ser um acesso não-discriminatório, degrada o serviço por um lado, mas dá essa opção", declara. A opinião dele é que o gerenciamento de tráfego é "absolutamente necessário para que o ISP possa dar uma experiência satisfatória". Ele alega ainda que a determinação em lei de exigências de qualidade de serviço poderiam ser alérgicas a novas tecnologias. "Não sabemos o que o QoS (quality of service) vai demandar no futuro dos serviços, talvez isso não nos dê a flexibilidade para futuras aplicações."

A proposta do CPqD, representada pela advogada especializada em políticas públicas de Internet, Nathalia Foditsch, é de uma corregulação, ou "regulação 2.0". "É ter uma instituição multistakeholder que provê supervisão na regulação; não apenas o governo, mas a sociedade civil e a indústria seriam envolvidos", declara. "Isso é importante porque garante a supervisão e coíbe abusos óbvios." Nathalia acredita que, com o Marco Civil, o Brasil tem uma abordagem de neutralidade mais conservadora do que a dos EUA, mas que é mais próxima da corregulação pela participação do CGI.br, um comitê multistakeholder.

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