Por enquanto, não passa de mera especulação (que coincidentemente ou não atende em cheio aos desejos do Opportunity) a notícia publicada em reportagem da Folha de S. Paulo nesta sexta, 2, sobre o interesse da Orascom nas participações dos fundos de pensão, Citibank, Telecom Italia e Opportunity na Brasil Telecom, Telemar e Telemig/Amazônica Celular. Fundos de pensão e Citibank asseguram que não receberam nenhuma proposta da Orascom, liderada pelo empresário egípcio Naguib Sawiris.
Se é que existe alguma negociação, ela se dá apenas entre o grupo de Daniel Dantas, a Telecom Italia e a Orascom. Segundo fontes de mercado, quem assessora o presidente da Orascom, Naguib Sawiris, é o broker e especulador de bolsa brasileiro Naji Nahas, que também tem relações comerciais com Daniel Dantas e é amigo pessoal de Marco Tronchetti Provera. Provera é ex-presidente da Telecom Italia, mas ainda influi bastante na empresa e conta com executivos alinhados a ele dentro da companhia. Foi Nahas quem intermediou a negociação entre Telecom Italia e Daniel Dantas em abril de 2005, pela qual a Telecom Italia se comprometeu a pagar mais de US$ 400 milhões pelas ações de Dantas na Brasil Telecom. Como o acordo não deu certo (fundos e Citibank impediram), os italianos acabaram pagando "apenas" US$ 65 milhões ao grupo Opportunity, em troca do fim de uma série de ações judiciais, que ao final também não foram retiradas por conta da intervenção de fundos de pensão e Citibank. Ou seja, os italianos, com a ajuda de Nahas, pagaram US$ 65 milhões a Dantas em troca de nada.
Mas a notícia de que a Orascom teria feito uma oferta pela parte dos fundos de pensão e Citibank tem ainda um outro objetivo aparente: ajudar Daniel Dantas em sua defesa e estratégia na ação que corre na Justiça de Nova York. A ação é movida pelo Citibank, que pede uma indenização por quebra de dever fiduciário e gestão fraudulenta de pelo menos US$ 300 milhões.
Oferta real, só para Dantas
Isso fica claro quando se observa os últimos acontecimentos na Justiça de Nova York. Tanto Dantas quanto o Opportunity encaminharam um pedido ao juiz Lewis Kaplan, dia 28 de fevereiro, para que ele flexibilize uma ordem dada em 7 de junho de 2005, que impede o Opportunity de negociar qualquer coisa que envolva suas ações na Brasil Telecom. O grupo de Dantas diz que "isto (a restrição colocada por Kaplan) se tornou um problema por conta da aproximação entre Opportunity e Orascom (…), um investidor que busca negociar a participação do Opportunity na Brasil Telecom". Em declaração assinada, Daniel Dantas diz ainda: "O Opportunity deseja iniciar as conversas e, se chegar a um acordo com a Orascom, quer vender seus interesses."
Logo em seguida, o Opportunity faz uma acusação contra o Citi: "Entendemos que a Orascom procurou o Citibank para adquirir as ações do CVC Fund na Brasil Telecom. Pelo fato de os fundos de pensão terem uma agenda diferente, e por conta das relações entre o Citibank, os fundos de pensão e o governo brasileiro, o Citibank não pôde ou não quis entrar, nesse momento, em uma negociação com a Orascom".
Daniel Dantas vai além. Diz à Justiça de Nova York que a Orascom estaria fazendo também uma oferta pela parte da Telecom Italia na Brasil Telecom e que os fundos de pensão também estariam buscando adquirir esta participação. O Citibank, segundo apurou este noticiário, não recebeu proposta alguma da Orascom. A própria Orascom só confirma uma oferta pela parte da Telecom Italia, diz a agência Dow Jones.
O que existiu entre o Citi e a Orascom foi uma sondagem. A Orascom tem relações comerciais com o Citibank em outras áreas. Naji Nahas tem atuado como conselheiro de Sawiris, dizem fontes bem informadas, o que pode indicar uma conexão com Dantas por trás dos boatos.
O Citibank, na Justiça de Nova York, até concorda que Dantas possa negociar as suas ações na Brasil Telecom, mas alerta o juiz Lewis Kaplan para o risco de que, no meio da negociação, o Opportunity esteja vendendo também os direitos de uso sobre o umbrella agreement, o polêmico contrato, contestado judicialmente pelos fundos e pelo Citi no Brasil e nos EUA, pelo qual Dantas continuaria mandando nos investimentos dos fundos. O Citi já havia alegado esse mesmo risco em relação ao acordo que Dantas fez com a Telecom Italia em abril de 2005, e Kaplan concordou com o argumento do Citi, impedindo Dantas de entrar em qualquer transação.
Lewis Kaplan deveria decidir nesta sexta, 2, sobre a flexibilização da sua ordem de junho de 2005, provavelmente permitindo a Dantas vender suas ações para a Orascom, mas apenas suas ações, e não nenhum tipo de acordo ou contrato a elas associado. O Citi concordaria com uma decisão como essa, conforme ele mesmo coloca em documentos à Justiça de Nova York. Só pede para que o Opportunity seja obrigado a apresnetar, em 48 horas, todos os detalhes de qualquer acordo que venha a firmar para a venda de suas ações.
A declaração de Dantas à Justiça de Nova York está disponível em www.teletime.com.br/arquivos/affidavit_dantas.pdf.
Tag Along
O problema é que a Orascom é um elemento estranho na estrutura societária da BrT, e a sua entrada certamente significaria a obrigatoriedade de tag along para os demais acionistas, conforme a legislação brasileira. Como a Brasil Telecom Participações está valendo em bolsa, a preço de ontem (quinta, 1) R$ 9 bilhões, isso significaria que a Orascom teria que pagar R$ 6 bilhões pelo controle, e R$ 3 bilhões para os minoritários que têm ações ordinárias. Ninguém dos fundos de pensão ou do Citibank acredita que a empresa, cujo faturamento está na casa dos US$ 3 bilhões, terá fôlego para isso. E comprar apenas a parte da Telecom Italia, com o imbroglio judicial que está armado, seria muito arriscado. Daí a desconfiança do Citibank de que está sendo vendido o direito de uso do umbrella agreement, como aconteceu com a Telecom Italia em 2005.
Significado da notícia
A informação divulgada pela Folha de S. Paulo de que haveria uma oferta da Orascom pela parte de todos os controladores da Brasil Telecom (fundos e Citi) mais Telecom Italia e Opportunity provavelmente servirá a Dantas como evidência, na Justiça de Nova York, de que teria havido tal oferta. Ainda que fundos e Citibank neguem, uma matéria de jornal sempre tem seu peso nesses processos judiciais.
O que faz fundos de pensão e Citibank acreditarem que a notícia da Folha de S. Paulo tenha vazado por meio de pessoas que têm acesso a informações privilegiadas e que têm interesses nessas negociações é o valor colocado em relação à oferta que fundos e Citi fizeram pela parte da Telecom Italia na BrT: US$ 450 milhões. Ao que tudo indica, o valor está correto, apurou este noticiário, e apenas pessoas próximas à Telecom Italia teriam interesse de passá-lo para a imprensa. Vale lembrar que a Orascom é acionista da Wind, operadora italiana de telefonia celular em que o presidente é Paolo Dal Pino, ex-presidente da Telecom Italia no Brasil na época da celebração do acordo dos italianos com Dantas, em abril de 2005. Dal Pino foi para a Wind em janeiro de 2006, logo depois que a transação com o Opportunity no Brasil começou a fazer água.
Especulação intensa
Outro fato chama a atenção sobre a notícia. Segundo apurou este noticiário junto a fontes muito bem informadas, teria havido, na quinta, 1, um movimento anormal de compra de ações ON da Brasil Telecom, a tal ponto que a diferença de preço entre ONs e PNs teria chegado ao recorde de quase 130%, o que nunca havia acontecido desde o tempo da privatização. Detectar quem foram estes compradores é complicado, pois a maior parte é de fundos de investimento baseados em paraísos fiscais. Apenas uma ação dura da CVM sobre esses fundos e junto às autoridades dos paraísos fiscais permitiria detectar quem está por trás do movimento especulativo, e se há relação desta especulação com os rumores divulgados pela imprensa.
Nesta sexta, 2, depois da notícia da Folha de S. Paulo, os papéis da Brasil Telecom chegaram a ter alta de 10%. Vale lembrar que o mesmo aconteceu quando foram publicadas reportagens, na Folha de S. Paulo, Exame e O Globo, sobre uma suposta concretização da venda da TIM, o que depois mostrou-se uma notícia falsa. As ações tiveram fortíssimo movimento especulativo em poucas horas de negociação.